Filippo Mario Nazareno Gomes Fogaccia
Nos últimos anos, a questão climática global e seus impactos no planeta e na vida humana tem sido o foco de discussões que mobilizaram projetos e mudanças nas matrizes energéticas, industriais e produtivas de diversos países.
As mudanças climáticas, que são essencialmente as alterações ocorridas nas características do clima e na temperatura do planeta, ocorrem devido as atividades antropogênicas. Os efeitos da mudança no clima são diversos: aumento do nível dos oceanos, o que causa desastres em cidades litorâneas; mudança no regime de chuvas, o que afeta a produção agrícola; e alteração na temperatura global, o que provoca aumento de casos de doenças transmitidas por vetores e outras enfermidades infecciosas.
As mudanças climáticas se tornaram protagonistas das discussões globais desde meados de 1800, já que, com a Revolução Industrial, as atividades produtivas passaram a utilizar combustíveis fósseis como carvão e gás natural. Quando queimados, esses combustíveis liberam na atmosfera dióxido de carbono (CO2), um dos gases responsáveis pelo efeito estufa. O termo “efeito estufa”, de uso comum, é usado para se referir a um fenômeno que certamente afetará o clima em todo o mundo ao longo do século 21 e nos séculos seguintes.
A Terra, aquecida pela radiação solar, emite uma parte dessa energia, na forma de uma radiação não visível, denominada infravermelho térmico. Esse mesmo tipo de energia é irradiado por uma panela de ferro quando aquecida. Alguns gases presentes no ar, como o dióxido de carbono, podem absorver radiação infravermelha térmica, reemitindo-a em todas as direções, inclusive para a Terra, aquecendo-a. Assim, o CO2 e outros gases no ar formam um “cobertor natural” que mantém a Terra aquecida. Esse fenômeno é denominado de efeito estufa e é responsável por manter a temperatura média da superfície da Terra em aproximadamente +150C. Se esses gases que absorvem infravermelho térmico não existissem, a temperatura média da superfície da Terra seria de -150C. (ou seja, a superfície da Terra seria eternamente coberta de gelo). O fenômeno que preocupa os cientistas é que o aumento da concentração de gases estufa colocaria mais “cobertores” na atmosfera, o que poderia elevar a temperatura da superfície da Terra para além de +150C. Esse fenômeno é chamado de efeito estufa intensificado, e toda vez que se caracteriza um aumento da temperatura média da superfície da Terra devido a intensificação do efeito estufa, o fenômeno é comumente denominado aquecimento global.
Além do efeito estufa, outros impactos causados pelas atividades humanas sobre o meio ambiente vieram à tona com o desenvolvimento de áreas como a ecologia. Nesse contexto, muitos países começaram a promover formas alternativas de desenvolvimento que integrassem a preservação da natureza e dos recursos naturais. Surgiram, assim, as principais conferências sobre o meio ambiente, que passaram a versar sobre as melhores estratégias, metas e ações pautadas sob uma perspectiva ambiental.
A primeira das grandes conferências ambientais da história foi realizada no dia 5 de junho de 1972, em Estocolmo. A denominada Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável consagrou a data como o Dia Mundial do Meio Ambiente. Nessa conferência, a Declaração de Estocolmo estabeleceu 26 princípios sobre desenvolvimento e meio ambiente, dando início a uma série de conferências ambientais em que os países reconhecem sua responsabilidade com a sustentabilidade.
Em 1992, no Rio de Janeiro, foi realizada a segunda Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), conhecida por Rio-92, Eco-92 ou Cúpula da Terra. Essa conferência foi considerada um dos principais marcos históricos das conferências que tratam questões ambientais. Com a presença de representantes de 172 países e centenas de organizações ambientais, o encontro teve como resultado a assinatura de cinco importantes acordos ambientais: a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento; a Agenda 21; os Princípios para a Administração Sustentável das Florestas; a Convenção da Biodiversidade; e a Convenção Quadro sobre a mudança do Clima. Este último -- a Convenção Quadro sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) -- criou um órgão chamado de Conferência das Partes (COP: Conference of the Parties), com o objetivo de avaliar, periodicamente, questões referentes a mudanças climáticas, propor mecanismos e medidas de cooperação, para garantir a aplicabilidade e efetividade da convenção.
A primeira Conferência das Partes (COP) foi realizada em Berlim, em 1995. Ela teve como principal foco as ações dos países para desenvolver políticas relacionadas às mudanças climáticas. O encontro marcou o consenso quanto à necessidade de aplicação de medidas para combater as consequências adversas decorrentes do efeito estufa. Nesta conferência, começaram as primeiras conversas que levariam ao Protocolo de Kyoto.
A terceira Conferência das Partes na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-3) ocorreu em dezembro de 1997 em Kyoto, Japão. No encontro foi adotado o Protocolo de Kyoto, que estabelece metas de redução para gases de efeito estufa para os países desenvolvidos, chamados "Países do Anexo I". Os americanos acabaram não ratificando o acordo. A entrada em vigor do acordo estava vinculada à ratificação por, no mínimo, 55 países que somassem 55% das emissões globais de gases de efeito estufa, o que ocorreu apenas em 16 de fevereiro de 2005, vencida a relutância da Rússia. Os Estados Unidos se retiraram do acordo em 2001.
No final do ano de 2015, aconteceu em Paris a 21ª Conferência das Partes, COP-21, que reuniu 196 Estados-Partes, com o intuito de se obter um novo acordo climático internacional, em que cada Estado-Parte apresentou sua proposta de redução de emissão de gases de Efeito Estufa, o que se chamou de Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada (INDC, em inglês). Este acordo, o Acordo de Paris, tem como principal missão manter o aquecimento global bem abaixo de 2oC até o final do século, em relação aos níveis pré-industriais. A COP-21 já pode ser considerada uma conferência histórica, pois no dia 05 de outubro de 2016 foi atingido o limite mínimo previsto para que o Acordo de Paris possa entrar em vigência.
O Brasil é uma das Partes e apresentou sua INDC, com a meta de diminuir as emissões de gases de Efeito Estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030, tendo 2005 como ano-base. Para atingir tal objetivo, a INDC brasileira contém ações como o fim do desmatamento ilegal na Amazônia, a restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares, a recuperação de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas e o alcance de 45% na participação de energias renováveis na composição da matriz energética. Aqui nota-se o pioneirismo brasileiro, já que, desde 2005, o Brasil realiza estudos e desenvolve projetos visando uma fonte limpa de energia, o hidrogênio, em sua matriz energética.
Em novembro de 2022, a 27° Conferência das Partes (COP-27) foi realizada em Sharm el-Sheikh, no Egito, em um cenário de eventos climáticos extremos no mundo. O evento reuniu 195 partes, mais de 20 mil agências especializadas, organizações intergovernamentais e não governamentais, bem como a mídia internacional, com o objetivo principal de garantir a plena implementação do Acordo de Paris.
Na COP-27, foi aprovada a Agenda de Adaptação de Sharm-El-Sheikh que visa atingir os seguintes objetivos:
1. Transição para uma agricultura sustentável e resistente ao clima que possa aumentar a produção em 17% e reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 21%, sem expandir as fronteiras agrícolas, e ao mesmo tempo melhorando a subsistência, inclusive dos pequenos agricultores;
2. Proteção e restauração de cerca de 400 milhões de hectares em áreas críticas (ecossistemas terrestres e de água doce), apoiando comunidades indígenas e locais com o uso de soluções baseadas na natureza para melhorar a segurança hídrica e a subsistência e para transformar 2 bilhões de hectares de terra em manejo sustentável;
3. Proteção de 3 bilhões de pessoas através da instalação de sistemas inteligentes e de alerta precoce;
4. Investir 4 bilhões de dólares para assegurar o futuro de 15 milhões de hectares de manguezais por meio de ações coletivas para deter a perda, restaurar, dobrar a proteção e garantir financiamento sustentável para todos os manguezais existentes;
5. Expandir o acesso à cozinha limpa para 2,4 bilhões de pessoas a partir de pelo menos 10 bilhões de dólares/ano em financiamento inovador;
6. Mobilizar de 140 a 300 bilhões de dólares necessários em fontes públicas e privadas para adaptação e resiliência e estimular 2.000 das maiores empresas do mundo para integrar o risco climático físico e desenvolver planos de adaptação acionáveis;
7. Criar um fundo específico para ajudar os países em desenvolvimento a responder a perdas e danos. Isso daria maior flexibilidade aos países em desenvolvimento que são particularmente vulneráveis aos efeitos adversos da mudança climática.
O Brasil, um dos participantes do evento, tinha um número recorde de estandes na COP: um do governo brasileiro, com cerca de 300 m2, o da sociedade civil (chamado Brazil Climate Action Hub), com 150m2 e dos governadores da Amazônia, com 120m2. Em cada espaço, o país propôs ações que o colocaram como protagonista da COP-27.
O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, foi o chefe da delegação brasileira na COP-27, e lançou, durante o evento, a Agenda Brasil + Sustentável. O documento, construído de forma colaborativa entre os ministérios, lista ações alinhadas com os objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS).
A posição brasileira na COP-27 recebeu contribuição da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que demandou metas de financiamento climático, mecanismos focados em adaptação, planos para o setor da agricultura, e a operacionalização dos mecanismos de mercado de carbono. Ainda, foi assinada uma aliança estratégica entre Brasil, Indonésia e República Democrática do Congo, os três países com as maiores florestas tropicais do mundo. A aliança, conhecida como “Opep das Florestas”, objetiva coordenar a posição dos países nas negociações climáticas e financeiras sobre o tema.
No Brasil Climate Action Hub, o governo federal apresentou iniciativas de energias verdes no país, como eólica, solar, biomassa e hidrogênio. O estande do Brasil contou com a presença da CNA, Confederação Nacional da Indústria, da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.
O protagonismo brasileiro também se deve pela participação de grupos de pequenos empresários brasileiros que apresentaram seus empreendimentos e iniciativas no ramo da energia renovável, tema central da COP-27.
A participação do Brasil como uma das partes em evidência no evento também se deu com a participação do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, que afirmou trazer o Brasil de volta “para propor uma nova governança global”. Lula anunciou a meta de zerar o desmatamento e a degradação dos biomas brasileiros até 2030, a criação do Ministério dos Povos Originários, defendendo que “a luta contra o aquecimento global é indissociável da luta contra a pobreza e por um mundo menos desigual e mais justo”. O presidente eleito ofereceu o Brasil para sediar a COP-30, em 2025.
Marina Silva, deputada eleita e figura chave no governo Lula, dá sinais fortes de que a recuperação do papel histórico do país nas negociações climáticas deve mesmo acontecer: “o Brasil não vai mais para a COP na condição de país chantagista, que vai chantagear os países ricos, dizendo que só vai proteger a Amazônia se nos pagarem para isso. O compromisso do Brasil sempre foi proteger a Amazônia e os biomas brasileiros. É uma decisão estratégica, política e ética do Brasil”.
Assim, percebe-se que o Brasil sai da conferência do clima COP-27 na direção correta de minimizar os impactos das atividades humanas sobre o clima, bem como assume o papel principal de propor ações que façam do mundo um lugar melhor promovendo e garantindo o futuro das próximas gerações.
Filippo Mario Nazareno Gomes Fogaccia é coordenador de vestibulares, professor de Química das 3ª séries do Ensino Médio e do curso MackVest do Colégio Presbiteriano Mackenzie -- São Paulo.