Os perigos da lavra subterrânea podem ser controlados
POR REDAÇÃO
-
28 de novembro de 2018
3786 Visualizações
Trabalhar em mineração, desde o início da industrialização, pode ser uma das profissões civis mais perigosas.
Stephen Bruce Harrison
Atualmente, grandes avanços têm sido feitos para melhorar a segurança dos mineradores ao redor do mundo. Por exemplo, de acordo com os dados publicados pelo Departamento do Trabalho dos Estados Unidos, o número de fatalidades ligadas à mineração na indústria de carvão nos EUA na década de 90, era de 32 a cada 100.000 mineradores.
Na primeira década deste milênio as fatalidades caíram para 27 a cada 100.000 mineradores e por sete anos inteiros desta década a média caiu para 17 fatalidades. Mas o que está por trás deste enorme aumento da segurança nas mineradoras?
Em primeiro lugar, deve-se considerar as principais causas de fatalidades em mineração: os problemas com a qualidade do ar na mina causados por calor excessivo, gases tóxicos, falta de oxigênio ou concentração de gases inflamáveis; e os incidentes relacionados ao uso de explosivos para detonação das rochas ou colapsos causados pela perfuração.
Em relação à qualidade do ar, há duas medidas preventivas que têm uma influência positiva na segurança em mineração: melhoras na qualidade dos sistemas de ventilação que trazem ar fresco para a mina e os altamente confiáveis detectores de gás que os mineiros usam quando trabalham no subterrâneo.
Para examinar o tópico sobre ventilação em mineração subterrânea no Brasil, sob a perspectiva de um operador, Barbara Corrêa Avelar que estudou no Canadá e no Brasil e já trabalhou na Prospec Jr. Consultoria e na Brio Inc. em Pilar (GO), acha que a Agência Nacional de Mineração (ANM), antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), é responsável por regular todas as atividades mineradoras no Brasil, mas, não é diretamente responsável por regular as emissões de gases.
“Em relação à legislação brasileira, há alguns padrões de segurança definidos pelo Ministério do Trabalho: o padrão NR 22 é responsável pela saúde e segurança em mineração, enquanto que a NR 15 é responsável pelas atividades e operações potencialmente insalubres”. Especificamente em relação à mineração subterrânea, faz-se necessário a presença de equipamentos que movimente o ar para que o mesmo se renove continuamente e os gases inflamáveis e a poeira sejam diluídos.
“Em áreas de trabalho, o oxigênio nunca deve estar abaixo de 19% do volume. Em minas de carvão, o fluxo de ar deve ser de pelo menos 6 m³/min/pessoa, enquanto que em outras minas o fluxo de ar deve ser maior que 2 m³/min/pessoa. Os valores limite de várias substâncias são definidas pelo NR 15 e esses valores são os mesmos tanto para a mineração a céu aberto quanto para minas subterrâneas. Portanto, ventilação apropriada nas minas subterrâneas é extremamente importante e necessária para garantir a segurança”, acrescenta Avelar.
Detecção de gás na mina
Na indústria de mineração a deficiência de O2 e acúmulo de CO2 são comuns. Outros perigos também existem, como, por exemplo, o gás metano que pode ser expelido por bolsões de gás quando são atingidos durante a escavação e podem se acumular a níveis explosivos. Se há alguma combustão, a subsequente explosão pode causar danos incalculáveis, frequentemente resultando em fatalidades.
O H2S é formado na mina devido ao processo de drenagem ácida da água existente na mina. Em algumas regiões do mundo ele é liberado diretamente pelo carvão fresco exposto. Então, pode-se concluir que a detecção de gases como o metano, CO2 e H2S são essenciais para salvar vidas.
A queda nos níveis de oxigênio subterrâneo no ambiente fechado das minas é causado porque o maquinário e os explosivos consomem oxigênio em processos de combustão. Apenas uma pequena redução no valor padrão de 20,9% de oxigênio no ar é considerado como deficiência de oxigênio e é perigoso. A deficiência de oxigênio é um dos mais conhecidos e invisíveis perigos de toda a mineração.
Além disso, o monóxido de carbono (CO) é um subproduto da combustão interna de motores usados em minas e de explosões. Estes gases que são subprodutos da combustão interna de motores ou explosões, contem CO e são conhecidos pelos mineiros como pós-lavagem.
Barbara Avelar acredita que os diferentes gases podem ser testados em uma mina, normalmente os mais comuns são o CO, o CO2 e o metano. “Adicionalmente, os gases NOx (mistura de óxido nítrico e dióxido de nitrogênio), NH3 (amônia), H2S e SO2 (dióxido de enxofre) são comumente associados à minérios subterrâneos e seus limites são respectivamente 12ppm, 8ppm, 8ppm e 2ppm”, explica.
Tudo isso apenas acrescenta à exigência de um detector de gases sofisticado para ser usado tanto de maneira fixa quanto de uma maneira portátil. E para assegurar que o equipamento continue funcionando no difícil, empoeirado e úmido ambiente de uma mina subterrânea, ensaios regulares devem ser feitos para garantir a segurança da mina e dos trabalhadores.
Os detectores de gás são um dos dispositivos de segurança mais importantes de um minerador. Seu capacete, assim como a sua lâmpada, também se classificam nesta categoria denominada obrigatória. Antes de entrar na mina, a lâmpada pode ser testada quanto à funcionalidade com uma verificação visual. Mas como é possível garantir que os detectores de gás estão funcionando?
O diretor técnico da Enesens, Alexandre Sá, assegura que há um padrão nacional, a NR 33, que confirma os procedimentos de segurança para permissão, entrada e trabalho em espaços confinados. Os padrões recomendados em relação aos riscos atmosféricos são: o LEL, oxigênio, CO e H2S devem ser verificados antes da entrada e durante o trabalho. Se há riscos adicionais, eles devem também ser monitorados.
A NR 33 estabelece que uma verificação, ou bump test com os detectores, deve ser realizada antes do início do trabalho. Portanto, essa verificação deve ser feita no início de cada turno. Para fazer este teste funcional, ou bump test como é conhecido, as misturas de gases, contendo baixos níveis dos gases a serem detectados, são passadas pelos sensores no detector de gás.
“Isso estimula o perigoso cenário real e deve ativar os alarmes do aparelho. Apenas quando o minerador estiver satisfeito com a reação do detector de gás a esses estímulos, ele deve seguir para dentro da mina”, complementa Sá.
A MSA e a Dräger são algumas das empresas que vendem produtos relacionados à detecção de gases e segurança em várias indústrias, como mineração, construção e óleo e gás. ”Não há nenhuma aprovação específica para os detectores de gás serem usados em minas subterrâneas, mas há uma aprovação nacional que se aplica a qualquer instrumento a ser usado em áreas classificadas com o Inmetro nº 179 – e a conformidade com essa aprovação é obrigatória”, aduz.
Há dois grandes tipos de detectores de gás, os portáteis e os fixos. De acordo com Barbara Avelar, os detectores de gás portáteis são mais comumente utilizados na indústria mineradora, porque à medida que a mina se aprofunda, os ajustes necessários para esse equipamento são mínimos, enquanto que se um detector fixo é utilizado, ele necessitara mais manutenção e mudanças para vários locais.
“Os detectores fixos de gás são mais comuns em operações em superfícies, como por exemplo na indústria de gás e óleo e são frequentemente usados para detectar vários gases. Por exemplo, o Dräger Polytron 8100 EC pode detectar uma gama de gases tóxicos e oxigênio. Com relação aos detectores de gases portáteis, existem para um único, dois ou vários gases. Para operações subterrâneas no Brasil, é mais comum usar o detector multigás, como o Altair 5X da MSA ou o X-am 5000 da Dräger”.
Quando um detector de gás é escolhido, alguns critérios devem ser seguidos. Em primeiro lugar, os gases a serem detectados devem estar de acordo com a legislação local de segurança e devem estar de acordo com os perigos da mina em questão.
Em minas de carvão, envolve no mínimo a medição simultânea de metano, CO, H2S e oxigênio. O aparelho deve também ser intrinsicamente seguro e, portanto, deve evitar riscos de ignição.
Em operações em minas de minérios os detectores de gás são voltados em geral para emissões de diesel que emitem gases como CO ou NOx. Além disso, muitos fatores desempenham um papel na performance do sensor, a robustez da unidade, o tamanho e peso, a facilidade com a qual o teste funcional é realizado, captação de dados para auditoria e operacionalidade.
O gerente de marketing da Dräger, Christoph Feyerabend, acha que o ritmo da inovação com detectores de gases é assombroso. “É muito provável que este foi um dos fatores contribuintes nas melhoras da segurança nas mineradoras em décadas recentes. O X-am 5000 da Dräger é capaz de medir até cinco gases tipicamente encontrados em minas. Indo um passo além, introduzimos o X-am® 5600 que também detecta um sexto componente, CO2, por meio de um detector infravermelho duplo, providenciando uma performance altamente precisa e uma vida útil longa”.
A inclusão de sensores adicionais não é mais um grande desafio tecnológico, mas como cada sensor adicional o tamanho, peso e consumo de bateria do detector de gases aumentam, o desafio é agrupar tudo isso em um projeto prático e portátil. ”A extensão do alcance de gases foi algo que nossos clientes na indústria de mineração estavam particularmente interessados em ver, e nós estamos vivenciando uma tendência geral em outras indústrias, como as de petroquímicos, um processo para integrar uma maior variedade de sensores em nossos detectores”, prossegue Feyerabend. “Nosso X-am® 5600 é, acreditamos, o mais compacto detector de 6 gases disponível no mercado internacional hoje em dia”.
Os sensores usados em detectores de gases geralmente dependem de eletroquímica e muitos dos sensores necessitam de calibração ou substituição em intervalos prescritos, para evitar os problemas de leitura no resultado mensurado. Essa ocorrência de calibração é mais precisa que o funcionamento diário e, enquanto o teste de funcionamento geralmente ocorre na parte superior do poço de mineração, a calibração geralmente ocorre em um laboratório fora do local. Alternativamente, o detector pode ser devolvido ao fabricante para uma revisão geral, que pode também envolver reposição de alguns dos sensores contidos nos detectores de gases.
Alexandre Sá opina que, em relação à calibração, há algumas diferenças entre fabricantes e laboratórios de calibração, e a NBR-33 vê a necessidade de frequente calibração. “Mas o que é evidente é que calibrações rastreáveis são necessárias e que a calibração feita por grupos internos ou terceiros associados com a RBC (Rede Brasileira de Calibração) devem ser registradas. Ademais, é comum ter uma calibração terceira com a emissão de um certificado de calibração para o detector de gases pelo menos uma vez por ano. Para assegurar uma cadeia ininterrupta de rastreamento, este certificado de detector de gases deverá fazer referência ao certificado de análise da mistura dos gases de calibração utilizada para conduzir o teste”.
Para Barbara Avelar, a qualidade de detectores de gases pode ser garantida por um certificado de conformidade, emitido pelo Inmetro. Para auxiliar com o registro e a documentação da calibração e teste de detectores de gases, muitas companhias optam por tecnologia digital.
De acordo com Christoph Feyerabend da Dräger, o X-am® 8000 é novo, adicionando ainda mais flexibilidade em relação aos sensores, como por exemplo um sensor PID. Ele também possui melhor orientação ao usuário, uma bomba interna e uma interface Bluetooth sem fio. “Este é o novo modelo emblemático orientado para aplicações de especialistas para espaços confinados como em resgate nas minas. Com a interface ele será capaz de conectar com um software em nuvem Dräger CSE via um app para smartphones. Isso preparará o caminho em direção a uma documentação sem papel e administração de medição de folga”.
A disponibilidade de misturas de gases para testes funcionais no Brasil é geralmente alta. Muitos dos principais fornecedores de gases industriais e gases especiais ao redor do mundo são capazes de produzir gases em cilindros para este propósito porque os requisitos de certificação e acreditação são relativamente diretos.
A disponibilidade de misturas de gases acreditadas para calibração ISO Guide 17034, que são a escolha recomendada para a calibração de detecção de gases, não é, por outro lado, uma questão tão simples. De acordo com o supervisor da MSA Brasil, Jackson Machado, os testes de resposta podem ser originados no Brasil por fornecedores conhecidos como a Portagas e Calgaz, mas os regulamentos que devem ser seguidos significam que se precisa usar material de referência de padrão primário para a calibração do detector de gases.
“Para originar este nível de mistura de gases, nós optamos por importar produtos da Coregas na Austrália. Seu material de referência certificado ISO Guide 17034 para misturas de gases, contém os componentes que precisamos nas concentrações alvo requeridas. E mais importante para a calibração, elas atendem aos mais altos padrões metrológicos requeridos pela Cgcre, a agência que acredita as operações em laboratórios no Brasil”, explica.
O gerente da Coregas Pty Ltd, Mark Qin, comenta sobre sua experiência com misturas de gases especiais acreditadas. “Nossa jornada com acreditação de gases para especialidades começou em 1997 quando conquistamos a acreditação ISO 17025 como um laboratório de calibração para misturas de gases para calibração. Subsequentemente, a Coregas conquistou a acreditação ISO Guide 34 em 2002, o que nos fez o primeiro produtor de material de referência acreditado na Austrália. Além disso, uma versão atualizada do ISO Guide 34 chamada ISO 17034 será implementada a partir de 2018 e nós teremos a avaliação da acreditação logo”.
A autoridade de acreditação responsável pela produção e operações de teste da Coregas é o NATA, Associação Nacional de Autoridades de Teste da Austrália, que é o único corpo de acreditação na Austrália, equivalente à Cgrec do Inmetro. Sua reputação é mundial e além de trabalhar na Austrália, o NATA também engaja em acreditação amplamente na Ásia.
Ambas as acreditações ISO 17025 e ISO 17034 são importantes e têm algumas diferenças: a ISO 17025 é para gases de teste como um laboratório de calibração e a ISO 17034 é para a produção de material de referência, então seu foco é em rastreamento, estabilidade, homogeneidade e incerteza de medição.
“A preparação para uma nova acreditação ISO Guide 34 leva aproximadamente um ano para reunir dados de qualidade suficientes e os processos relevantes”, observa Oin. “Depois, a preparação da documentação para a avaliação tipicamente leva mais três meses adicionais. Portanto este é um processo de intensa mão de obra e custos, que necessita da atenção da maioria dos especialistas de nosso laboratório. E estas acreditações não são somente um evento isolado, ambas acreditações devem ser reavaliadas a cada 18 meses pelo NATA para garantir que nossos sistemas de qualidade se mantenham sob controle.”
Quando se trata do enchimento de misturas de gases é possível preparar misturas de calibração de gases especiais certificadas, mas não acreditadas, em pequenos lotes por conta de velocidade e economia. Contudo, a maioria das misturas ISO Guide 34 devem ser preparadas em cilindros individuais, que envolvem muito mais mão-de-obra por cilindro e resultam em custos de produção mais altos.
Oin diz que há quatro membros do time de laboratório de gases de especialidades que são signatários do NATA para os certificados acreditados ISO Guide 34/ISO 17034. “Entre eles, são 38 anos de experiência como signatários do NATA para produção de material de referência. Além disso, há cinco signatários do NATA em nosso time na Coregas para a acreditação ISO 17025, e eles têm um total de 60 anos de experiência combinada como signatários do NATA para teste de gases. Eu pessoalmente estive envolvido com o processo de acreditação do NATA por mais de 18 anos. Na Coregas, nosso pedigree cresceu por servir clientes de mineração na Austrália. Em anos recentes, nossa reputação e nossos cilindros de gases especiais têm viajado mundo a fora e nós estamos orgulhosos em ser um fornecedor para muitos fabricantes de aparelhos de detecção de gases multinacionais e companhias de manutenção de equipamento de detecção de gases no Brasil”.
Stephen Bruce Harrison é britânico, com formação em engenharia química e mestrado pelo Imperial College de Londres. Atualmente, é consultor independente e freelancer em sua empresa sbh4 GmbH – www.sbh4.de/