Os países em desenvolvimento – entre eles, o Brasil – registram altos índices de acidentes nas ruas e estradas porque a população tem maior poder aquisitivo para comprar veículos, mas, em contrapartida, as cidades sofrem com a falta de planejamento dos gestores públicos, que não se preocupam em proporcionar uma mobilidade urbana eficiente aos cidadãos. A afirmação é do secretário geral do International Transport Fórum (ITF), José Viegas. Viegas e outros especialistas em transporte público participaram, nesta terça-feira (8), em Brasília (DF), da abertura do 19º Congresso Brasileiro de Transporte e Trânsito. De acordo com o representante do ITF, três frentes devem ser atacadas para reduzir o número de acidentes no país em até 50%: combate ao excesso de velocidade, incentivo ao uso do cinto de segurança e punição aos motoristas que dirigem embriagados. Outro ponto importante é o cuidado para garantir a segurança aos pedestres e ciclistas. Sobre a falta de projetos de mobilidade para quem trafega a pé pelas cidades brasileiras, Viegas citou um fato curioso. Para chegar ao local do evento, tentou se deslocar a pé do hotel onde está hospedado em Brasília até o Centro de Convenções Ulysses Guimarães, um pequeno trajeto de mais de um km. Disse que ficou inseguro e pediu ajuda a um policial para atravessar as ruas porque não encontrou calçadas, viu apenas vias rápidas destinadas à travessia dos veículos. “O Brasil é um dos campeões em número de mortes. Muita coisa precisa ser feita neste país. Temos que trabalhar na gestão dos veículos, melhorar a infraestrutura, conscientizar os jovens condutores e ter uma legislação mais rigorosa”, destacou Viegas. Ele citou exemplos de países que, na última década, investiram em mobilidade urbana e reduziram o número de mortes no trânsito – Espanha, Portugal, Islândia, Luxemburgo e Irlanda diminuíram os números em 50%. No entanto, Argentina e África do Sul aumentaram as estatísticas em 3% e 64%, respectivamente. “A população está ‘descobrindo’ o automóvel”, explicou. O superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Luiz Carlos Mantovani Néspoli, confirmou que as discussões sobre mobilidade urbana estão diretamente ligadas à segurança viária. “É inadmissível não pensar neste componente. Apesar de registrarmos ações pontuais em algumas cidades, não temos uma política para cuidar deste assunto. O país precisa expressar uma visão de futuro, posicionar-se socialmente diante dos problemas e estabelecer uma meta clara de redução de acidentes”, afirmou. Planejamento Segundo o presidente da ANTP, Aílton Brasiliense Pires, os principais problemas do transporte público brasileiro estão ligados à falta de planejamento urbano. “Precisamos planejar o transporte para o comércio, serviços, indústrias, educação e lazer. Não podemos fazer isso de qualquer jeito. Esta é a forma mais cara de pensar as cidades. Devemos estruturar melhor a sociedade civil para construirmos o país que queremos”, destacou. O presidente da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor), Lelis Marcos Teixeira, afirmou que “os cidadãos precisam se conscientizar da importância do transporte público para ter mais qualidade de vida”. Para ele, cidades sustentáveis não são aquelas em que se levam três horas para chegar ao trabalho ou se gastam bilhões em estacionamento para guardar veículos. Na opinião do presidente executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Otávio Viera Cunha, o modelo como as cidades brasileiras foram planejadas, nos últimos anos, era uma ‘crise anunciada’, cujo ápice da insatisfação da população ficou registrado nas manifestações de junho. “É preciso estabelecer diretrizes e dar prioridade ao transporte público, fazer planos de mobilidade, construir redes integradas e estabelecer uma política tarifária justa”, reivindicou. |