Algas podem transformar gases de efeito estufa em biomoléculas
Uma equipe multidisciplinar do Fapesp Shell Research Centre for Gas Innovation (RCGI) está estudando microalgas com potencial para a produção de bioprodutos a partir de gás carbônico e metano provenientes do gás natural. Os cientistas coletaram amostras na região da Baixada Santista (Cubatão e Guarujá) e isolaram 24 microalgas diferentes. Destas, quatro produziram tanto lipídios como biopolímeros. Sob a orientação da professora Elen Aquino Perpétuo, bióloga e coordenadora dos projetos 17 e 18 da instituição, o grupo também está selecionando bactérias para a produção específica de PHB (um biopolímero de alto valor agregado) a partir de metanol.
“A pesquisa com as bactérias está um passo à frente, porque já sabemos quais são as mais promissoras na produção de PHB. No caso das microalgas, ainda estamos identificando aquelas com maior potencial produtivo para dar o próximo passo, que é a otimização dessa produção”, resume Bruno Karolski, biólogo e aluno do Pós-doutorado em Engenharia Química na Escola Politécnica (Poli) da USP.
Segundo ele, a ideia inicial era usar o gás natural diretamente na cultura de microalgas para que o gás carbônico presente no gás natural fosse captado por elas, mas o grupo agora estuda se vale mais a pena separar o gás natural em CO2 e CH4 e ministrar às microalgas apenas o CO2.
Da esquerda para a direita: prof. Elen Aquino Perpetuo, pós-doutorando Bruno Karolski; prof. Cláudio Augusto Oller do Nascimento; doutoranda Letícia Oliveira Bispo Cardoso; pós-doutoranda Louise Hase Gracioso
“Das 24 microalgas que isolamos, quatro apresentaram rápido crescimento, alta concentração celular, produção de lipídios e também indícios de produção de PHB. Dessas quatro, identificamos três: duas cepas de Chlamydomonas sp., com características produtivas diferentes, mais a Didymogenes sp. Nossos dados preliminares indicam que para duas delas é possível obter esses bioprodutos concomitantemente, mas ainda não sabemos quais são as condições em que elas produzem mais lipídios ou mais PHB. O que sabemos é que, ao colocar as quatro microalgas selecionadas nas mesmas condições, duas se destacam porque uma produz mais PHB e a outra mais lipídios”, afirma Karolski. Ele lembra também que os lipídios produzidos pelas microalgas, ácidos graxos de cadeia longa e com alto potencial energético, são úteis, por exemplo, para a fabricação de biodiesel.
Segundo Letícia Oliveira Bispo Cardoso, química e doutoranda no Programa de Pós-graduação Interunidades em Biotecnologia da USP, há relatos de produção eficaz de PHB por microalgas, porém apenas quando modificadas geneticamente. “Em nosso caso, estamos explorando a diversidade de microalgas de um ambiente da Baixada Santista, visando encontrar as capazes de produzir PHB e também grandes concentrações de lipídios”, esclarece ela.
Bactérias e plástico
Os cientistas conseguiram extrair PHB produzido a partir de metanol de cinco das 180 cepas de bactérias com que trabalharam: Methylobacterium extorquens, Methylobacterium rhodesianum, Methylopila oligotropha, Methylobacterium radiotolerans e Methylobacterium populi.
“A Methylobacterium extorquens foi a que deu melhores resultados até agora: utilizando-se metanol como substrato, as bactérias chegaram a produzir 40% de PHB em 72 horas. A porcentagem de PHB é equivalente à relatada na literatura e agora estamos explorando maiores concentrações de oxigênio, testando agitação e diferentes concentrações de metanol para ver se conseguimos otimizar essa produção”, diz Letícia.
Bactérias Chlamydomonas sp (à esquerda) e Methylobacterium extorquens (à direita) – Foto: Wikimedia Commons
Os pesquisadores também relatam resultados bastante positivos com a Methylopila oligotropha. “Há poucos relatos na literatura de produção de PHB com essa bactéria e, no entanto, conseguimos uma produção de 25% de PHB. Isso é bastante promissor”, ressalta Karolski.
Letícia salienta que não se produz muito PHB no mundo a partir de metanol, pois a fonte de carbono mais comum do PHB é o açúcar. De acordo com ela, a oportunidade que a pesquisa possibilita, neste caso, é baratear a fonte de carbono para produção de PHB. “O açúcar é uma matéria-prima cara para se fazer plástico e acaba afetando o valor final do biopolímero. Esse é um dos fatores economicamente relevantes que pode ajudar a ampliar a participação do PHB no mercado de plásticos, entre outros”, revela a pesquisadora.
Karolski lembra que o RCGI tem projetos que visam à produção de metanol a partir de metano e dióxido de carbono. “Ou seja: estamos tentando usar gases de efeito estufa (GEEs) para formar metanol e, a partir dele, produzir um plástico biodegradável. Assim, estaremos mitigando GEEs e, ao mesmo tempo, obtendo bioprodutos de alto valor agregado.”
O grupo conta ainda com a bióloga e aluna de pós-doutorado em Engenharia Química na Poli, Louise Hase Gracioso, e com Bruna Bacaro Borrego, que está se graduando em Engenharia Ambiental na Unifesp. O professor Cláudio Augusto Oller do Nascimento também integra as equipes dos 17 e 18 do RCGI.