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Alternativas tecnológicas para o transporte rodoviário de passageiros no Brasil

Márcio de Almeida D'Agosto – CTN/Despoluir - 12 de fevereiro de 2014 1363 Visualizações
Alternativas tecnológicas para o transporte rodoviário de passageiros no Brasil
 
No mundo todo o transporte responde pelo consumo de mais de 50% dos derivados de petróleo. No Brasil, no ano de 2009, aproximadamente 87% das viagens de passageiros realizadas por modos coletivos ocorreram por meio do uso de ônibus movidos a óleo diesel de petróleo, responsáveis pela emissão de 27,8 milhões de toneladas de CO2. Visando minimizar os impactos ambientais causados pelo seu uso e ao mesmo tempo ampliar a segurança energética, reduzindo a dependência da nação de uma única fonte energética, o país avança na busca por novas alternativas energéticas e tecnologias aplicadas aos sistemas de propulsão de veículos rodoviários.
Neste contexto, o Brasil dispõe de diversas alternativas tecnológicas que possibilitam o atendimento dos limites de emissão de poluentes atmosféricos previstos no pelo PROCONVE (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores) fase 7 (P7) ao mesmo tempo que exploram o uso de biocombustíveis (biodiesel, diesel de cana de açúcar e etanol), combustíveis fósseis potencialmente mais limpos que o óleo diesel (gás natural) e tecnologias de propulsão mais eficientes sob a ótica do consumo de energia (propulsão híbrida diesel-elétrica e diesel-hidráulica).
Recente estudo realizado pelo Laboratório de Transporte de Carga (LTC) do Programa de Engenharia de Transporte (PET), programa do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (COPPE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em parceria com a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (FETRANSPOR) realizou uma avaliação de aspectos técnicos, políticos, financeiros e ambientais de um conjunto de opções tecnológicas, buscando compará-las em situação de operação na cidade do Rio de Janeiro considerando o horizonte de tempo dos grandes eventos que acontecerão na cidade, como a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016.
Verificou-se que o uso de tecnologia de ponta nos motores dos veículos é indispensável, uma vez que o uso de combustíveis alternativos ou suas misturas com o diesel de petróleo (20% de biodiesel e 80% de óleo diesel de petróleo - B20, 10% de diesel de cana de açúcar e 90% de B5 - AMD10 e gás natural comprimido - GNV) em motores projetados para atender as emissões do PROCONVE fase 5, não atende aos limites de emissão de poluentes atmosféricos previstos para o PROCONVE fase 7, sendo indispensável a adoção de veículos com tecnologia que atenda aos limites de emissão do P7, os quais apresentam um acréscimo na faixa de 8% a 16% no investimento inicial em chassi e entre 1,4% e 3,0% no custo operacional (em relação ao P5).
Benefícios ambientais significativos quanto a redução da emissão de poluentes atmosféricos locais (redução de 28% de CO – monóxido de carbono, 30% de HC – hidrocarbonetos totais, 60% de NOx – óxidos de nitrogênio, 80% de MP – material particulado) são decorrentes da implantação de tecnologia que atende aos limites de emissão estabelecidos pelo P7. Porém, espera-se uma redução marginal (1,9% a 4%) na emissão de CO2 – dióxido de carbono - decorrente do uso desta tecnologia, de modo que o uso de combustíveis alternativos pode contribuir com reduções adicionais na emissão de poluentes atmosféricos locais e globais, mas não substituirá a necessidade da implantação de tecnologia que atenda aos limites estabelecidos pelo P7.
Quando analisadas em relação à tecnologia P7, as alternativas1 P7D_AMD10, P7D_B20 e P7P_AMD10 destacam-se por não necessitarem de investimentos adicionais ao já realizado pela introdução do P7, além disso, apresentam custo operacional igual ou pouco maior (1%) que as alternativas P7. No que tange aos aspectos ambientais, verifica-se que a alternativa P7P_ED95 é a que apresenta maior redução na emissão poluentes locais (92% de CO, 50% de MP, 15% de HC e 89% de NOx) e de CO2, (100%)2. As alternativas P7D_AMD10 e P7P_AMD10 são as que apresentam menor redução nos poluentes locais, enquanto a alternativa P7T_GNVD é a que representa menor redução (1%) na emissão deste GEE.
Além de considerar aspectos ambientais, a escolha da melhor alternativa tecnológica para uso em ônibus no Rio de Janeiro depende do enfoque a ser considerado pelos agentes do processo, onde a consideração de aspectos técnicos e políticos recomendam a escolha de alternativas que impliquem em baixos riscos para a sociedade, o poder concedente e os operadores. Desse modo, foram realizadas análises considerando os itens: emissão de poluentes atmosféricos locais, emissão de CO2, aspectos técnicos e aspectos políticos em função do custo operacional do veículo, medido em R$/km.capacidade [passageiros]. Uma pesquisa com especialistas3 foi realizada para avaliar os aspectos técnicos e políticos. A síntese desta análise encontra-se na Tabela 1.
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Critérios adotados para aspectos técnicos: Alta aceitação técnica quando o produto já existe e encontra-se disponível para uso, sua cadeia de suprimento encontra-se estruturada e o risco de não conformidade e não atendimento a demanda é baixo.
Critérios adotados para aspectos políticos: Alta aceitação política quando o produto for de fácil aceitação pelo operador do veículo e pelo poder público, tiver baixa dependência de financiamento, baixo risco associado a fabricação e uso do produto,  alto potencial de redução da dependência de derivados de petróleo e alto potencial de uso de combustíveis renováveis.
Neste contexto, destacam-se de forma positiva a alternativa que propõe o uso de B20 em ônibus convencionais operando em linhas interbairros e alimentadoras e ônibus articulados em linhas troncais.
Por outro lado, embora apresentem os maiores benefícios ambientais, as alternativas que propõem o uso de GNV dedicado e etanol não foram bem avaliadas pelos especialistas e o uso de sistema diesel-gás deve ser considerado com cuidado, por se posicionar em situação limítrofe para a opção menos adequada, excetuando-se a redução de emissão se CO2.
De uma forma geral, os resultados relativos obtidos quando se considera a relação custo operacional versus emissão de poluentes atmosféricos locais deixa clara a relação de compensação (trade-off) que existe entre custo operacional e redução de emissão de poluentes atmosféricos locais. Para a maioria das alternativas consideradas não se verificou situação onde ao mesmo tempo se ocorre significativa redução na emissão de poluentes atmosféricos locais e reduzidos custos operacionais. Neste sentido, destaca-se o uso das alternativas híbridas, que podem proporcionar baixo custo operacional, se adequadamente utilizadas em regimes operacionais que maximizem o rendimento energético em sua operação e ao mesmo tempo redução adicional a já obtida com a introdução da tecnologia que atende aos limites de emissão de poluentes atmosféricos estabelecidos pelo P7. 
Não se encontram alternativas tecnológicas que apresentem baixo custo operacional e ao mesmo tempo apresentem elevada redução de poluentes atmosféricos locais se comparadas ao que já foi possível obter com a introdução da tecnologia que atende aos limites de emissão de poluentes atmosféricos estabelecidos pelo P7.
No que se refere ao financiamento para aquisição das alternativas tecnologicas, um ensaio preliminar foi realizado. Resguardadas as limitações decorrentes das premissas adotadas, que podem estar, nos casos onde se considera tecnologia de ponta, bastante distantes na situação ideal, verifica-se que a adoção do B20, diesel de cana (AMD10) e sistema diesel-gás poderiam ser facilmente apoiada pelos mecanismos de financiamento estabelecidos pelo FINAME, com pequeno ajuste da taxa de financiamento. Por outro lado, alternativas que consideram o uso de gás natural comprimido, etanol aditivado e veículos híbridos diesel-elétricos teriam que receber algum tipo de apoio adicional a melhores taxas de financiamento para que se viabilizem. Nestes casos, recomenda-se um estudo mais detalhado quanto a melhor forma de financiar e/ou subsidiar o uso destas opções tecnológicas de modo que se possa aproveitar seus expressivos benefícios ambientais.
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1 - O código das alternativas considera: P7 – a tecnologia atende aos limites de emissão de poluentes atmosféricos estabelecidos pelo P7; D, T, P, H ou A – veículo com motor dianteiro, traseiro,  veículo padron, veículo híbrido ou veículo articulado e o último conjunto de letras representa o combustível alternativo utilizado, o tipo de sistema híbrido (série ou paralelo) ou o tamanho do veículo articulado (18 ou 21 metros). Os combustíveis alternativos considerados neste trabalho são: B20 - 20% de biodiesel e 80% de óleo diesel de petróleo; AMD10 - 10% de óleo diesel de cana de açúcar, 4,5% de biodiesel e 85,5% de óleo diesel de petróleo; GNV - gás natural veicular (comprimido) – o código GNVD indica veículo dedicado a GNV e o código DG indica veículo diesel-gás - e ED95 - etanol hidratado aditivado.
2 - Considera-se exclusivamente a emissão de CO2 no uso final e desconsidera-se o percentual de aditivo, cuja composição é desconhecida e não se pôde avaliar o potencial de emissão de CO2.
3 - Foram consultados 11 especialistas que atuam na: COPPE/UFRJ, IVIG/COPPE/UFRJ, Poli/UFRJ, SPTrans, Cenpes-Petrobras, SEA, ANP, FETRANSPOR e Ministério das Cidades.
(Márcio de Almeida D´Agosto. Graduado em Engenharia Mecânica e de Automóveis e Mestre em Engenharia de Transportes pelo Instituto Militar de Engenharia. Doutor em Engenharia de Transportes pela COPPE/UFJF, no qual é professor desde 2006.)