Retornando à Lua
O primeiro lançamento do foguete SpaceX Falcon Heavy (Bill Jelen/ Unsplash)
Jose Antonio de Sousa Neto*
Planos para retornar a Lua até a metade desta década e possivelmente ir até Marte antes da próxima já têm uma concretude palpável. São inúmeras as tecnologias que vão permitir esse novo grande passo para a humanidade. Avanços nas mais variadas áreas da ciência, dede a computação às ciências biológicas, tem um vetor comum que se sustenta pelos avanços da engenharia em suas inúmeras dimensões. Não podemos esquecer, por exemplo, que mesmo os mais maravilhosos avanços recentes na área da medicina sempre trazem como companheiros de jornada instrumentações e forças da natureza que foram de alguma forma ou de outra trabalhadas e disponibilizadas pela engenhosidade e pelos avanços da engenharia. Como curiosidade seguem abaixo uma breve descrição de três áreas afeitas à exploração espacial humana
Tecnologias de propulsão
Ao longo dos últimos 50 anos, portanto desde o primeiro pouso do homem na Lua com a missão Apollo 11, diversas novas tecnologias de propulsão têm sido pesquisadas. Uma delas seria a propulsão elétrica solar. Nela grandes matrizes solares se desenrolam para capturar energia solar, que é então convertida em eletricidade. Isso alimenta algo chamado propulsor de Hall. Há prós e contras. No lado positivo, você precisa de muito menos combustível, fazendo com que a espaçonave fique mais leve. Mas também leva mais tempo para atingir o seu destino lá. A propulsão elétrica solar poderia então, por exemplo, ser usada para enviar carga a Marte antes de uma missão humana. Isso garantiria que equipamentos e suprimentos estivessem prontos e aguardando os astronautas quando eles chegassem usando foguetes químicos.
Outra ideia é usar foguetes químicos para decolar da Terra e pousar em Marte. Mas na parte intermediária da jornada, alguns engenheiros propõem o uso de algo chamado propulsão elétrica térmica nuclear. Os astronautas podem ser enviados para o “portal de partias” nas proximidades da Terra em uma capsula como a da Space X ou a Orion da Nasa. A cápsula da tripulação Orion então atracaria com um veículo de transferência. Uma vez que Orion tenha sido conectado ao veículo de transferência, um foguete elétrico nuclear seria usado para levar a cápsula da tripulação e o módulo de transporte para Marte, onde eles se ligam a um orbitador (uma espécie de estação espacial) e um lander (veículo de pouso) específico para descer até a superfície, que aguardam na órbita de Marte.
Orion (à direita) voa no espaço enquanto está ancorado com um módulo lunar na representação deste artista da Nasa.
Em um foguete elétrico térmico nuclear, um pequeno reator nuclear aquece o hidrogênio líquido. A forma gasosa do elemento se expande e dispara para fora do propulsor. Poder-se-ia reduzir, por exemplo, o tempo de trânsito até Marte para três meses, o que ainda é uma jornada muito longa, mas é cerca de um terço do tempo que a propulsão química requer para nos levar até lá
Outra ideia é a propulsão por íons elétricos. Um tipo de propulsor chamado Vasimr que usa ondas de rádio para ionizar e aquecer um propulsor e, em seguida, um campo magnético para acelerar a sopa resultante de partículas - o plasma. A eletricidade necessária pode ser gerada de diferentes maneiras. Mas, para enviar seres humanos para Marte, a equipe quer usar um reator nuclear. Esta tecnologia ainda é bem experimental e aumenta-la será extremamente desafiador, mas também com promissoras perspectivas a longo prazo
Embora as novas tecnologias sejam interessantes, no contexto de nosso atual desenvolvimento tecnológico, foguetes químicos líquidos ainda precisam ser a base de qualquer missão humana na Lua e em Marte. A palavra chave é confiabilidade.
Água e oxigênio
A Nasa há muito tempo planeja extrair água da Lua para abastecer colônias humanas e futuras explorações espaciais. Os cientistas da Nasa trabalham silenciosamente nas tecnologias de mineração de água há anos em pequenos laboratórios. Uma tecnologia promissora tira proveito da química da sujeira da lua - ou regolito - adicionando hidrogênio, que então reage com óxido de ferro na sujeira da lua para produzir água. Esses reatores de redução de hidrogênio aquecem o regolito a cerca de 1.000 graus Celsius, para que possam ocorrer as reações químicas apropriadas. Um processo conhecido como eletrólise pode então dividir a água extraída em hidrogênio e oxigênio puros, tanto para combustível de foguetes quanto para suprimentos de ar de astronautas. A Nasa já testou um reator de redução de hidrogênio no vulcão MaunaKea do Havaí. Durante uma operação de um ano, produziu 660 kg de oxigênio a partir de um solo rochoso contendo 5% de óxido de ferro. Agora, os engenheiros têm um sistema de segunda geração em andamento que pode produzir 1.000 kg. Isso além de eventuais bolsas subterrâneas de gelo. A Nasa também avalia a tecnologia de microondas para extrair água da lua. Testes em permafrost lunar simulado mostraram que microondas com raios podem vaporizar 98% do gelo d'água e capturar 99% da água extraída na forma de gás - tudo sem a necessidade de perfurar ou cavar em condições frias, onde o gelo d'água pode se tornar tão sólido quanto o granito. A tecnologia de microondas continua em sua infância, mas poderia ter "economia de energia significativa" em comparação com a escavação e o aquecimento de grandes massas de regolito.
A construção de bases habitáveis
A criação de uma futura base lunar poderia ser muito mais simples usando uma impressora 3D para construí-la a partir de materiais locais. Parceiros industriais, incluindo os renomados arquitetos Foster + Partners, juntaram-se à ESA (Agencia Espacial Europeia) para testar a viabilidade da impressão 3D usando solo lunar.
Agência Espacial Europeia trabalha com a Foster + Partners Arquitetura e parceiros para imprimir estruturas em 3D na lua (ESA/ Foster + Partners)
Uma vez montadas, as cúpulas infladas são cobertas por uma camada de regolito lunar impresso em 3D por robôs para ajudar a proteger os ocupantes contra radiação espacial e micrometeoritos.
O professor Bernard Foing, cientista da Agência Espacial Européia, diz que um dos melhores lugares para construir uma base pode ser no Polo Sul Lunar. Altas elevações recebem luz solar durante quase todo o ano, o que significa que deve ser relativamente fácil gerar energia solar abundante. E acredita-se que as crateras permanentemente sombreadas do pólo abrigam grandes depósitos de gelo, que poderiam ser derretidos para beber água e divididos usando eletrólise para fornecer oxigênio para os astronautas respirarem e hidrogênio para usar como combustível de foguete.
A água também poderia ser usada para irrigar as culturas nas estufas lunares. Um estudo de 2014 de cientistas holandeses mostrou que cenouras e tomates podem crescer em solo semelhante ao solo empoeirado e rochoso (regolito) que cobre a lua.
Outra alternativa seria a priorização de locais subterrâneos. Em Marte como na terra talvez seja possível encontrar espaços subterrâneos cavados por vulcanismo ou talvez, quem sabe, até mesmo por correntes de água que talvez tenham existido em um passado bem remoto.
Imagem do dia 9/2/2018 - Pequena base humana subterrânea em uma caverna de Marte pela artista ambiental indonésia Sefrina Arifin.
Pequena base humana subterrânea em uma caverna de Marte pela artista ambiental indonésia Sefrina Arifin
As vantagens desta opção, em um contexto bastante inóspito de falta de atmosfera como na Lua ou de uma atmosfera bem menos densa como a de Marte (além da ausência de um campo eletromagnético protetor como o que existe na Terra), são evidentes e determinantes. De toda forma os fundamentos científicos e princípios basilares da engenharia serão os mesmos que já conhecemos. Evidentemente, como em todo projeto de engenharia, novos processos e tecnologias estarão sendo desenvolvidos para responder a cada novo desafio específico.
Epopeias mais distantes terão de esperar saltos tecnológicos mais significativos. Talvez a energia necessária esteja embutida e possa ser extraída do próprio espaço tempo. Pensando nas “distorções” deste espaço tempo causadas pela presença de massas como os planetas, as estrelas e os buracos negros e na expansão do próprio universo fundamentada nas evidencias científicas que possuímos, talvez possamos no futuro percorrer um caminho promissor. Na, talvez, bem restrita compreensão tridimensional que temos é como se o universo como um todo fosse uma grande “mola” com uma energia potencial quase infinita. Mas se por enquanto esta última parte ainda está na esfera da ficção científica as tecnologias descritas anteriormente, mesmo que ainda demandem desenvolvimentos muito importantes e a superação de desafios muito significativos, já estão a nosso alcance.
*Professor da EMGE (Escola de Engenharia de Minas Gerais)