De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) Contínua de 2019, feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as casas ou moradias horizontais representam 85,6% dos domicílios no Brasil e apenas 14,2% são apartamentos. Mas, apesar de sermos um país de urbanização predominantemente horizontal, especialistas em urbanismo são praticamente unânimes em dizer que o processo de verticalização nos grandes centros urbanos é uma tendência sem volta, o que não impede que os condomínios horizontais sejam um nicho importante do mercado imobiliário, mesmo em cidades grandes como Goiânia, uma das capitais com maior número de empreendimentos residenciais com essa tipologia.
De acordo com a arquiteta e urbanista Suzy Alves, sócia-diretora do escritório Norden Arquitetura, nos últimos dez anos a capital goiana experimentou um movimento forte de pessoas que deixaram edifícios residenciais, muitas vezes em áreas nobres, para buscarem mais espaço e bem-estar em condomínios horizontais mais afastados. “As pessoas, em sua grande maioria, veem os condomínios verticais como uma opção que oferece mais segurança e que estão mais perto de escolas, do comércios e do trabalho. No entanto, há uma parcela significativa da população que anda estressada com o grande movimento dos centros urbanos — e é este o principal motivo pelo qual muitos buscam a qualidade de vida dos condomínios horizontais, mesmo que mais distantes”, afirma Suzy.
A arquiteta e urbanista avalia, inclusive, que a pandemia evidenciou como o fato de não estarmos bem com o local onde moramos pode impactar em nosso bem estar físico e mental. “As pessoas perceberam que a moradia com a família vai além dos ambientes fechados por paredes. Viram a necessidade de um espaço com mais paz de espírito para contemplar a natureza, respirar um ar mais puro e garantir segurança para as crianças atravessarem a rua e brincarem nos parques”, afirma.
No caso de Goiânia, capital que reúne o segundo maior número de residenciais horizontais no País, são mais de 250 conforme dados da Associação dos Desenvolvedores Urbanos do Estado de Goiás (ADU-GO), há o impacto de uma forte ligação com a cultura rural e sertaneja, fazendo com que uma boa parte dos goianienses tenham um perfil mais tradicional e prefiram morar em casas. O problema é que para ter esse modo de vida, segundo explica Suzy Alves, se paga um preço que muitos consideram alto. “É necessário sair do centro urbano — com isso vem alguns transtornos como um tempo maior no trânsito, seja por causa do trabalho ou da escola dos filhos”, pondera a especialista.
Verticalização é benéfica
E é pelo fato de não poderem pagar esse “preço” de ter que mudar a rotina da família, que as moradias verticais nos centros urbanos acabam sendo a melhor opção para a grande maioria, que busca essencialmente segurança, conforto e comodidade. Por isso, a arquiteta e urbanista reforça que a verticalização é um processo sem volta e pode ser bom para as pessoas e para as cidades, se feito de forma planejada e sustentável.
“A verticalização é uma forma de aproximar um grande número de habitantes em uma área mais restrita com a proximidade de várias atividades. Este processo, se bem planejado e seguindo todas as regras do uso do solo, não gera problemas e atende a maioria da população”, explica Suzy Alves ao destacar que os modernos prédios residenciais investem cada vez mais em projetos com um vasto número de ambientes de lazer e com serviços compartilhados, o que faz com que o morador desfrute de uma qualidade de vida bem semelhante a que é oferecida num condomínio de casas.
Planejamento sustentável
Redução de áreas verdes, comprometimento do lençol freático e os impactos no trânsito são apontados como pontos críticos para a verticalização. Mas, Suzy argumenta que esses impactos podem sim ser neutralizados, e que o processo de verticalização pode ocorrer de forma sustentável se houver mudanças na forma de projetar os modernos prédios e atualização dos planos diretores das cidades.
“Mas, para que o processo de verticalização das cidades tenha um efeito sustentável positivo, é preciso mudar o jeito de projetar e construir. É preciso ter projetos que busquem soluções como: a eficiência energética para reduzir custos ambientais e financeiros; mecanismos para reaproveitar a água; investimento no desenvolvimento de fornecedores e materiais reutilizáveis com construções modulares para causar menor impacto ambiental”, esclarece Suzy Alves.
Ela ainda acrescenta que é essencial que o Plano Diretor das cidades passe por ajustes e atualizações. “Um tipo de atualização da legislação que vem ocorrendo em muitas grandes cidades é, por exemplo, dispensa de exigência de um grande número de vagas de garagem para os apartamentos — uma vez que hoje em dia é cada vez maior o número de pessoas que optam por transportes alternativos ao invés do uso do carro próprio. Sem falar ainda que reduziria os valores dos imóveis”, afirma.
A arquiteta e urbanista lembra que uma cidade verticalizada e compacta é mais positiva pois proporciona uma redução de gastos com serviços públicos e aumento da eficiência dos mesmos. “Numa cidade compacta, a menor necessidade do uso de transporte individual impacta positivamente no trânsito e no meio ambiente. Os serviços urbanos são mais eficientes e acessíveis, como coleta de resíduos, transporte público, energia elétrica e rede de água. Ao passo que numa cidade espraiada os custos dos serviços são maiores e muitas vezes não chegam a toda a população”, explica a arquiteta e urbanista.