Logotipo Engenharia Compartilhada
Home Notícias “Sanha entreguista” do governo pode significar retrocesso de 70 anos

“Sanha entreguista” do governo pode significar retrocesso de 70 anos

clube da engenharia - 05 de julho de 2016 1881 Visualizações
Compartilho da visão de que o grupo que está no poder não tem a menor preocupação com o interesse nacional”. A afirmação é do presidente do Clube de Engenharia, Pedro Celestino. Segundo ele, guiado por uma “sanha entreguista”, o governo Michel Temer pode significar um retrocesso de 70 anos no desenvolvimento brasileiro. Em entrevista, o engenheiro teceu duras críticas às forças que assumiram o poder com o afastamento da presidenta Dilma Rousseff.
“Eles não têm a menor preocupação com o desenvolvimento do país (...) Este grupo está única e exclusivamente interessado em atender ao interesse geopolítico dos Estados Unidos da América, daí porque realinhou a nossa política externa à visão norte-americana. Significa um retrocesso, não de 20, mas de 70 anos”, disse.
Em seu primeiro discurso no posto, no início de junho, o novo presidente da Petrobras, Pedro Parente, defendeu rever a legislação do pré-sal, que hoje determina uma participação mínima de 30% da estatal na exploração desses campos.
Para o presidente do Clube de Engenharia, a posição é equivocada e reflete o perfil do executivo. “Ele diz isso porque não tem visão nacional. Ele tem a visão de amesquinhar o papel da Petrobras na economia brasileira”, condenou.
Celestino destacou que a Petrobras – empresa-símbolo do país – é âncora do desenvolvimento industrial brasileiro, responsável por uma cadeia de mais de 5 mil fornecedores, que geram centenas de milhares de empregos e produzem receitas para o país. Nesse sentido, fazer com que a companhia ceda seu papel na exploração do pré-sal seria um equívoco, algo que não atenderia aos interesses verde-amarelos.
“O pré-sal é a maior descoberta de óleo do planeta nos últimos 30 anos. No mundo, há hoje duas grandes províncias petrolíferas: a da Arábia Saudita e a do pré-sal brasileiro. Abrir mão do papel de liderança da Petrobras na exploração e produção de petróleo e em toda a cadeia ligada ao petróleo, abrir mão do papel da Petrobras como uma empresa integrada, como todas as grandes petroleiras são, não atende ao interesse do país”, defendeu.

BNDES, ciência e tecnologia na berlinda
De acordo com ele, o descaso do governo Temer com um projeto nacional pode ser medido pelo enfoque dado ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
“Basta dizer que a presidenta do BNDES, Maria Silvia [Bastos Marques], não se referiu, no discurso de posse dela, à palavra ‘indústria’. Ela colocou como papel do banco financiar privatizações e concessões. O BNDES é o terceiro maior banco de desenvolvimento do mundo, desempenha há décadas papel importantíssimo na economia nacional. E agora está sendo relegado a mero financiador de concessões e privatizações”, lamentou.
O engenheiro também condenou a condução dada à área de Ciência e Tecnologia, segundo ele, desprezada pela atual gestão. “Foi relegada a uma posição secundária pelo governo, destruindo um esforço de anos. A política de incentivo à Ciência e Tecnologia vem, a bem da verdade, desde os governos militares. Tudo isso está sendo colocado em xeque, por força da sanha entreguista desse governo”, disse.

Destruir empresas nacionais de engenharia
Questionado se estaria em curso um processo de tentar enfraquecer a Petrobras, como forma de justificar uma política de privatização, Celestino não hesitou: “Com certeza”. Para ele, um exemplo disso foi a forma como teria sido ignorada a mais recente descoberta da companhia.
“A Petrobras anunciou no dia 15 de junho a descoberta de uma coluna de óleo leve de mais de 400 metros de espessura, no campo de Libra, de petróleo de excelente qualidade. E essa notícia não mereceu uma linha da imprensa. Nem o próprio governo comentou uma descoberta, que é a maior ocorrida em território nacional”, apontou.
Segundo ele, a “política de enfraquecer” a Petrobras não começou com a chegada de Parente à companhia, mas com uma instrumentalização da Operação Lava Jato. “Começou com a dimensão gigantesca que se deu à Operação Lava Jato, que era para apurar desmandos e que toda a sociedade aplaudiu, e passou a ter um conteúdo político nítido de destruir as empresas nacionais de engenharia e de destruir a Petrobras, porque ela é âncora do desenvolvimento brasileiro”, analisou.
Um dos argumentos utilizados para desvalorizar a Petrobras diz respeito à sua atual situação financeira. A petroleira possui hoje um endividamento bruto de R$ 450 bilhões. Celestino ponderou, contudo, que a companhia só está endividada porque tomou a decisão correta de investir na descoberta de petróleo.
“Eu já havia dito no início que não há novas descobertas de petróleo no mundo há 30 anos. As outras empresas petroleiras estão com a relação de endividamento muito mais baixa que a da Petrobras, porque não descobrem petróleo. Elas têm dinheiro, mas não têm petróleo. A Petrobras se endividou porque achou petróleo e estava corretamente investindo para aumentar a produção brasileira de petróleo para atender à necessidade nacional”, opinou.
Segundo ele, é o endividamento que possibilita o contínuo aumento da produção de petróleo, ao contrário do que tem ocorrido com os concorrentes, que têm reservas e produção diminuídas a cada ano.
O presidente do Clube de Engenharia rechaçou o alarmismo em relação à Petrobras, lembrando que foi exatamente essa circunstância que levou a Shell, petroleira anglo-holandesa, a comprar a BG no Brasil por US$ 75 bilhões de dólares, mesmo com o petróleo em queda.
“Fez isso porque via na compra a aquisição de reservas para possibilitar, a partir da exploração do nosso pré-sal, o aumento da produção de petróleo aqui no Brasil, dos 100 mil barris de óleo por dia para 500 mil barris por dia - o que corresponderá a 20% da produção de petróleo da Shell”.

Petrobras como mera produtora de óleo bruto
Celestino avaliou que o processo de “desmonte” da Petrobras teria começado ainda na gestão de Aldemir Bendine, ex-presidente da estatal. Indagado sobre a política de venda de ativos defendida por Parente, ele afirmou não ser contrário a vender ativos, mas desde que obedecendo a critérios – o que não estaria acontecendo agora.
“Toda empresa de petróleo compra e vende ativos. Mas tem que saber o que está vendendo e tem que saber qual a melhor oportunidade para vender. O que eles estão fazendo com essa venda de ativos é acabar com a característica principal da Petrobras, que é ser uma empresa integrada na área de petróleo. Isto é, uma empresa que explora, produz, refina o petróleo, vai para a petroquímica e tem cadeia de distribuição, atende a todo o território nacional. Isso eles estão querendo destruir”, criticou.
Segundo ele, caso se concretizem os planos da gestão Temer, a Petrobras passaria a ser mera produtora de óleo bruto. “Estão querendo vender a distribuidora [BR distribuidora], se desfazer da rede de dutos, alienar os navios, de tal forma que a Petrobras passe a ser uma mera empresa produtora de óleo bruto, como era a Venezuela antes de Chávez, importando tudo que vem do petróleo”, lamentou.

Empregos em Cingapura
Quando assumiu a presidência da estatal, Pedro Parente sinalizou também uma mudança de posicionamento na política de conteúdo local, que garante a aquisição de um volume mínimo de bens e serviços brasileiros nas encomendas feitas pela Petrobras.
Celestino comentou o posicionamento: “Claro, ele [Parente] não tem o menor interesse em defender o Brasil. Ele não está ali para isso. Então, para ele, o que importa é gerar emprego em Cingapura, desde que signifique melhor negócio para a empresa. A Petrobras é estatal porque atende ao interesse nacional. Se não for para atender ao interesse nacional, não precisa ser estatal”.
O presidente do Clube de Engenharia encerrou a entrevista citando que todas as medidas anunciadas estão dentro da “mesma lógica”, que é “enfraquecer a indústria brasileira e nos transformar novamente numa imensa plantation, uma grande fazenda”.
“Porque o agronegócio não tem a menor preocupação com isso. Para o agronegócio, o que importa é ter boa estrada e bom porto. E a cabeça do agronegócio está em Chicago, em Londres e, em Miami, para gastar o dinheiro. Não há a menor preocupação com o desenvolvimento brasileiro, como os seus antepassados também não tinham – os barões de açúcar, do café... O agronegócio é moderno, mas não tem visão nacional”, disparou.