Abcon e Abes discutem o futuro do saneamento na Fenasan 2018
Em julho, o Congresso Nacional recebeu a Medida Provisória (MP) 844/18, que tem como objetivo reformular o marco legal do setor de saneamento básico e traz como principal mudança a previsão de que a Agência Nacional de Águas (ANA) atuará como reguladora dos serviços públicos do setor, que abrange as atividades de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, manejo de resíduos sólidos e drenagem urbana. O assunto, que tem gerado bastante polêmica, foi debatido na 29° Feira Nacional de Saneamento e Meio Ambiente, mais conhecida como Fenasan, no dia 19 de setembro.
O painel “O Futuro do Saneamento” contou com a participação do Diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), Percy Soares Neto, e do Presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), Roberval Tavares de Souza, e trouxe ao palco opiniões divergentes.
De um lado, a Abcon defendeu a MP como essencial para que o Brasil consiga ampliar sua atual cobertura dos serviços de água e esgoto. Segundo a entidade, ela incentivaria a parceria entre os setores público e privado, fazendo com que o país retome seu compromisso com a universalização dos serviços de água e esgoto, prevista pelo Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) para 2033 – prazo que só será cumprido, de fato, na década de 2050, se o Brasil mantiver os baixos investimentos registrados nos últimos anos no setor.
“Diferente do que muitos pensam, a modernização do marco regulatório pode trazer melhoras significativas nas áreas que não têm recebido investimentos nos últimos anos”, ressaltou Neto. “Ninguém tem a expectativa de que a MP resolva a integralidade dos problemas, mas não dar esse passo possível rumo ao progresso seria muito negativo para o setor. Batalhar contra a MP é levar um setor que já é tão carente em investimentos para um novo ciclo de escassez”.
Em contrapartida, a Abes se posicionou contra a nova medida, alegando que ela tornaria a universalização ainda mais distante. “A grande dificuldade é que, ao escrever a MP, o Governo Federal não ouviu as solicitações dos principais agentes do saneamento, que há anos discutem melhorias para o setor”, declarou Souza. Segundo a entidade, o Ministério pretende utilizar a MP para a revisão, o que significa fazer uso de instrumento pouco democrático. Para este ponto, a Abes propõe alterar a legislação descrita na proposta referenciada por meio do mesmo mecanismo legal, ou seja, Projeto de Lei, que abre o debate no Legislativo, permitindo a maior participação da sociedade.
Além disso, a entidade luta pela retirada do Artigo 10-A da MP, que trata sobre o chamamento público de antes do contrato programa. Segundo Souza, o presente artigo aumenta ainda mais a seleção adversa ao interesse público, ou seja, induz as operadoras públicas e privadas a competirem apenas por municípios superavitários, deixando os deficitários ao encargo dos municípios e estados. Isso dificultaria a prestação do serviço de forma regionalizada e, ao dificultar a prática de subsídios cruzados, agravaria as diferenças na qualidade e na cobertura dos serviços, com prejuízo para a população mais carente. “Se a MP for aprovada do jeito que está hoje, ela causará a falência do atendimento da população, que ainda acontece de forma muito precária”, finalizou o presidente da Abes.
Entenda a Medida Provisória 844/18
A medida provisória MP 844/18, que muda as diretrizes do marco legal do saneamento básico no país, foi assinada pelo presidente Michel Temer em 6 de julho de 2018. Uma das principais alterações promovidas por ela foi tornar a Agência Nacional de Águas (ANA) uma agência reguladora dos serviços públicos de saneamento básico, atribuição que até então era do Ministério das Cidades. Se a MP for convertida em Lei, a ANA passará a ter papel relevante no setor de saneamento básico, sobrepondo-se às entidades reguladoras subnacionais.
Além disso, outro artigo da MP busca aumentar a concorrência entre concessionárias estaduais públicas e empresas privadas, ao tornar a abertura de licitação obrigatória toda vez que uma prefeitura quiser realizar obras de água e esgoto. Até agora, só era necessária a concorrência quando uma gestão quisesse contratar uma empresa privada. Se a opção fosse realizar o trabalho diretamente com uma empresa pública estadual, o procedimento não era exigido.