Foto: VILA DE SERRA PELADA, CURIONÓPOLIS (PA) / O formigueiro humano que cavou à mão uma cratera de 190 metros desapareceu por completo da paisagem de Serra Pelada. Foi substituído por um lago formado pelas chuvas. Não há mais ouro na superfície, mas é ainda possível encontrar um ou outro pedaço de quartzo. Uma nova mina está sendo aberta a menos de um quilômetro da Serra Pelada original, mas a paisagem é tão distante da vista 30 anos atrás que mais parece saída da imaginação de Julio Verne, autor de Viagem ao Centro da Terra. A mineradora canadense Colossus alugou o mesmo tatuzão usado nas obras de metrô em São Paulo para cavar a galeria de 200 metros de profundidade. Os vários caminhos que levam às fontes de ouro, no entanto, formam uma área subterrânea de dois quilômetros de extensão. Para descer os túneis escuros é preciso embarcar num veículo com tração nas quatro rodas e usar macacão, capacete com lanterna e cinto especial que inclui uma máscara de oxigênio para casos de incêndio ou deslizamento. Somente 20 trabalhadores descem a mina a cada turno, por razões de segurança. Se muita coisa mudou dentro da mina, a Vila de Serra Pelada continua praticamente a mesma. As ruas nunca foram asfaltadas e precisam receber um jato de água no fim da tarde para que as casas de madeira não sejam tomadas pelo pó vermelho. O vilarejo não tem uma só torneira de água potável nem tratamento de esgoto. Para chegar, o visitante precisa percorrer 35 quilômetros de estrada de terra. O sinal de somente uma operadora de telefonia chega a Serra Pelada - ainda assim, em pontos específicos que já quase viraram pontos de encontro dos moradores. Esperanças. Com tamanha falta de estrutura, a população tem, naturalmente, grande expectativa em relação ao reinício da exploração do ouro. Como os funcionários administrativos da Colossus também usam macacões facilmente identificáveis a quadras de distância, os moradores de Serra Pelada tentam, sempre que podem, apresentar suas demandas. A empresa tem um funcionário dedicado a ouvir a comunidade, mas diz que não tem obrigação de resolver os problemas sociais. Afirma que ajuda a comunidade com a geração de emprego e renda. Lembra ter investido R$ 600 milhões no projeto e que gera 1,5 mil empregos. Boa parte da comunidade de Serra Pelada é de ex-garimpeiros - portanto, sócios da Colossus no projeto. A mineradora só teve acesso à área após acordo com a cooperativa dos trabalhadores de Serra Pelada, a Coomingasp. O governo federal repassou a eles o direito da mina, que pertencia à Vale, em 2007. Após bancar o desenvolvimento do projeto, a múlti vai ficar com 75% do ouro. Em 2010, o Ministério de Minas e Energia ratificou o acordo sobre os porcentuais. O ministério nega benefício à mineradora e diz que já interveio para garantir que a fatia dos trabalhadores não fosse diluída ainda mais. Desde então, a Colossus já pagou R$ 54 milhões em royalties à cooperativa, mas o dinheiro nunca chegou às mãos dos garimpeiros (ler mais na pág. B7). A Colossus se defende. Diz que só usou as contas escolhidas pelos dirigentes da Coomingasp. Porém, para o promotor Hélio Rubens Pereira, do Ministério Público do Pará, a mineradora agiu de forma no mínimo atípica. Como pode uma multinacional confiar um patrimônio coletivo numa conta privada?, questiona. |