Cerca de 90% das cargas no Brasil são transportadas via rodovia, por caminhões. Congestionamentos, poluição, atrasos no embarque e desembarque de produtos e prejuízos às empresas são alguns dos problemas enfrentados pela população da Baixada Santista. Para fazer a sociedade refletir sobre a importância do transporte ferroviário, o jornalista, advogado e engenheiro civil José Manoel Ferreira Gonçalves escreveu o livro Despoluindo Sobre Trilhos. A obra mostra caminhos alternativos para lidar com o velho problema de transporte por cargas rodoviárias. Quais as principais vantagens do transporte ferroviário sobre o rodoviário para a economia nacional e, especialmente, para a Baixada Santista? Como o custo do transporte ferroviário é apenas um sexto do custo do rodoviário, a economia inteira é afetada e a vantagem mais imediata se dá pelo aumento da competitividade do País, o que gera empregos diretos e bem-estar a todos. A Baixada, devido ao inevitável aumento das exportações que isso provocaria, tendo o maior porto da América Latina, seria a região afetada positivamente em maior grau. Qual o tempo médio necessário para o deslocamento de um contêiner entre o interior de São Paulo e Santos? Qual seria este tempo caso a carga fosse transportada por trens? E em relação aos gastos com combustível? Em média, as velocidades de um trem de carga e de um caminhão são aproximadas, contudo, como com o trem não temos o congestionamento, a depender da época do ano esse tempo pode ser reduzido em dez, 20 ou mais vezes, o que além de liberar o acesso à Baixada, destravando sua economia, incrementaria o processo de embarque, gerando riqueza para a região. Seria um círculo virtuoso de causas e efeitos. Analise a implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) na Baixada Santista. O VLT pode contribuir diretamente para a melhoria do trânsito na região e, indiretamente, trazer novas oportunidades às cidades da região, além de criar um clima positivo, de otimismo, que ajudará a mudar nossa cultura, excessivamente concentrada em transportes individuais e em locomoção sobre pneus e não sob trilhos. Acho que o trecho escolhido para essa primeira fase pode não ser o melhor, mas o projeto tem mais pontos positivos que negativos. Mas será preciso eliminar diversos gargalos importantes, com muitas desapropriações. Espero que este projeto seja apenas o início de um grande desafio que em futuro não muito distante possa beneficiar mais gente em todos os municípios da Baixada, oferecendo essa alternativa mais rápida e eficiente a todos os moradores e turistas de uma forma geral. As cidades de Guarujá, Cubatão e Praia Grande também esperam essa modalidade de transporte, que não polui o ar, não gera poluição sonora e não disputa espaço com os ônibus, automóveis ou caminhões. O governo brasileiro deu incentivo tributário à indústria automobilística. Falta apoio para a indústria ferroviária? Quais as principais causas para o declínio da atividade? Os motivos primeiramente são históricos. As ferrovias inicialmente foram construídas para atender os interesses de determinados barões, para o escoamento das safras que esses produziam. Mesmo assim, até 1930 desfrutávamos de tecnologia ferroviária de ponta, nos abarbando com o que havia de melhor na Europa e Estados Unidos. Com a quebra da bolsa de Nova Iorque e a consequente derrocada do café brasileiro, nossas ferrovias entraram em obsoletismo, visto que não havia mais muito a transportar a partir de suas margens. Teria-se então que construir novas ferrovias, de onde havia produção, mas, seja pela revolução de 1930, seja pela II Guerra Mundial, isso foi sendo adiado. Por fim, o País abraçou um grande projeto industrialista, calcado na montagem de veículos. A contrapartida natural foi o investimento em rodovias, o que dificultou investimentos em ferrovias. O lobby das montadoras também foi decisivo nesse sentido. Esse contexto fez com que, hoje, ao contrário do resto do mundo, achar-se natural no Brasil o investimento em rodovias. Os governos são demandados nesse sentido, sem que se perceba o quão deletério é esse processo para a economia nacional e, principalmente, para o cidadão de menos recursos, o trabalhador. Qual o impacto econômico do transporte ferroviário sobre a mão de obra brasileira? Impacto direto. Gostando ou não gostando, a economia ocidental está completamente globalizada. Aqui consumimos vinhos chilenos, bugigangas chinesas e todo o mais do resto do mundo, mas temos enorme dificuldade de vender o que produzimos para o exterior, porque nossa logística é a mais cara do mundo. Na Rússia apenas 8% das cargas são transportadas sobre pneus, aqui essa cifra passa de 70%. Só com a diferença no custo poderíamos construir dez mil quilômetros das mais modernas ferrovias por ano. Contudo, falta difusão dessas informações e, como consequência, sobra desinteresse político. Um ciclo vicioso no real sentido da expressão. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) possui alguma iniciativa para intensificar o uso de trens no Estado? Os empresários reclamam que os custos logísticos são excessivos, que os prejuízos são grandes. Falam em R$ 17 bilhões por ano. Sabemos que a diferença de custo entre os modais ferroviário e rodoviário é enorme, a relação é de 1 para 6. Mas isso não tem sido suficiente para que haja um empenho forte dos setores do empresariado patronal na tarefa de conscientizaçãodos formadores de opinião pública e das autoridades de forma geral, para que se planeje a mudança da matriz modal de cargas do País. Transportamos, como disse acima, mais de 70% de nossas cargas sobre caminhões, expoliando com isso a indústria, mas principalmente o trabalhador. |