Primeiro processador com memória é construído por brasileiro
A junção de memória e processamento no mesmo chip imita a forma como o cérebro humano funciona.
[Imagem: EPFL/LANES]
Lógica sobre memória
Um engenheiro brasileiro, atualmente trabalhando na Suíça, liderou uma equipe que desenvolveu um processador de computador que combina duas funções - operações lógicas e armazenamento de dados - em uma única arquitetura.
É um grande avanço para a eletrônica e para a informática, uma vez que a união de computação e armazenamento no mesmo chip - também conhecida como "arquitetura lógica-sobre-memória" - dispensa a troca de dados entre processador e memória, tornando os computadores mais rápidos e com menor consumo de eletricidade.
Essa junção também era longamente esperada por seu potencial impacto no processamento de algoritmos de inteligência artificial.
O avanço histórico foi liderado por Guilherme Migliato Marega, engenheiro eletricista formado pela USP (Universidade de São Paulo), que atualmente trabalha na Escola Politécnica Federal de Lausanne.
Molibdenita
Para quem duvidava que o grafeno estava sendo deixado para trás na corrida rumo a uma era pós-silício, o novo chip é feito de um outro material monocristalino (2D), a molibdenita (MoS2).
A molibdenita, um material que consiste em uma única camada com três átomos de espessura, é um excelente semicondutor e já é o componente mais pesquisado no campo da fotônica (processadores que funcionam com luz em vez de eletricidade) e da spintrônica (uma espécie de meio caminho entre a eletrônica e a computação quântica).
O processador com memória coloca a molibdenita quilômetros à frente do grafeno.
[Imagem: EPFL/LANES]
Processador e memória juntos
O novo processador lógica-sobre-memória é feito com transistores de efeito de campo (FET) de portas flutuantes (FGFETs).
A vantagem desses transistores é que eles podem reter cargas elétricas por longos períodos - é por isso que eles são usados em memórias flash para câmeras, celulares e computadores.
E as propriedades elétricas exclusivas da molibdenita tornam este semicondutor particularmente sensível a cargas armazenadas em FGFETs, o que permitiu a criação de circuitos que funcionam tanto como células de armazenamento de memória quanto como transistores programáveis.
Ao usar a molibdenita, a equipe conseguiu incorporar várias funções de processamento em um único circuito com memória e alterar ambos conforme desejado.
"Essa capacidade dos circuitos de realizar duas funções é semelhante à forma como o cérebro humano funciona, onde os neurônios estão envolvidos tanto no armazenamento de memórias quanto na realização de cálculos mentais," comparou o professor Andras Kis, coordenador da equipe.
"O projeto do nosso circuito tem várias vantagens: Ele pode reduzir a perda de energia associada à transferência de dados entre unidades de memória e processadores, diminuir a quantidade de tempo necessária para operações de computação e diminuir a quantidade de espaço necessária. Isso abre as portas para dispositivos menores, mais potentes e com maior eficiência energética," acrescentou Kis.
Embora ainda seja um protótipo, a equipe está entusiasmada com a capacidade de levar a nova arquitetura rumo aos aparelhos eletrônicos e computadores vendidos no mercado: "Fizemos nosso primeiro chip há dez anos à mão. Mas, desde então, desenvolvemos um processo de fabricação avançado que nos permite fazer 80 ou mais chips em uma única rodada, com propriedades bem controladas," disse Kis.
Bibliografia:
Artigo: Logic-in-memory based on an atomically thin semiconductor
Autores: Guilherme Migliato Marega, Yanfei Zhao, Ahmet Avsar, Zhenyu Wang, Mukesh Tripathi, Aleksandra Radenovic, Andras Kis
Revista: Nature
Vol.: 587, pages 72-77
DOI: 10.1038/s41586-020-2861-0