Desde 12 de junho - data da primeira partida da Copa, no Itaquerão - Fortaleza vem ganhando novos ares. A zona litorânea e as vias que dão acesso ao Castelão estão mais limpas, organizadas, iluminadas e ocupadas. O fortalezense está fazendo festa, assistindo aos jogos com tevê na calçada e ocupando um espaço que é seu por direito: a rua. O grande fluxo de turistas estrangeiros – que lotam a avenida Beira Mar e cantam até a madrugada – só faz crescer a atmosfera cosmopolita, divertida e contagiante.
A maioria da população está se divertindo com o Mundial. Isso é inegável. Mas há um ranço quando as pessoas lembram que os pequenos e importantes cuidados com a Cidade poderiam ser executados não apenas durante, mas antes e depois do torneio – além de serem levados para as áreas periféricas de Fortaleza.
“Essa Copa prova que é possível ter uma capital melhor, bonita e organizada. Agora sabemos que os governos têm condição para manter a limpeza, a sinalização das avenidas. Tem muito policiamento, conforto, gente nas ruas. Se depois da Copa tivesse pelo menos a limpeza nos bairros, já seria uma evolução”, diz Luciano Albuquerque, 32, vendedor ambulante que aproveita o Mundial para aumentar os ganhos.
A Copa trouxe milhares de estrangeiros ao Ceará. Apenas na partida entre Alemanha e Gana, realizada no último sábado, 52% dos 60 mil ingressos disponibilizados pela Fifa foram adquiridos por turistas de outros países. Com a movimentação intensa, as praias e o Mercado Central ficaram lotados. Gesticulando, mostrando valores na calculadora ou arriscando frases em inglês mal falado, os vendedores também fizeram festa com a presença dos visitantes. “Está sendo um evento bom para as vendas. Não só por ter turista circulando, mas por ter segurança – que acaba deixando as pessoas à vontade nas ruas. Mas não deveria ser só durante a Copa, né?”, indaga Alfredo Ribeiro, 29.
Legado intangível
A realização do Mundial trouxe uma preocupação maior com a mobilidade urbana e consciência para a população, que passou a reivindicar pela melhoria dos serviços básicos. Além disso, houve esforço para receber os turistas e esse esforço prepara o comércio e o setor hoteleiro para atender melhor as pessoas do Brasil após o campeonato. É uma espécie de legado que não podemos definir, mensurar ou tocar – explica Marcelo Proni, mestre em Ciência Econômica e doutor em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas. “A Copa tem benefícios e vantagens intangíveis. Transformar essas mudanças das cidades em legado depende tanto das autoridades, como da população e da mídia. É preciso cuidar do legado intangível. Se não, ele será perdido”.
Mário Azevedo, professor do Departamento de Engenharia de Transporte da Universidade Federal do Ceará (UFC), dialoga com esse pensamento: “não acho que exista um legado negativo. Existem legados atrasados. Com a ‘desculpa’ da Copa, foi investido um montante bem maior em obras de mobilidade. Elas não ficaram prontas a tempo, mas acho que ficarão. Essas obras serão boas para quem visita Fortaleza, mas são necessárias para quem mora aqui”. Para ele, um legado que não pode ser esquecido é aquele da população tomar consciência de que o país (e a cidade) tem totais condições de organizar eventos de grande porte. “É uma espécie de remedinho contra o famoso complexo de vira-latas”.