No cérebro, o esquecimento entra como um elemento que torna todo o processo de memorização mais eficiente.
[Imagem: CC0 Public Domain/Pixabay]
Memória do cérebro versus memória da IA
É natural pensar que nossas memórias não conseguem competir com as memórias dos computadores porque, salvo algum defeito inesperado, "um computador nunca esquece" - no disco rígido ou na nuvem, ele sempre "se lembra" do que você mandou ele gravar.
Ocorre que a inteligência artificial não se sai tão bem quanto o nosso cérebro quando se trata da eficiência no armazenamento de memórias.
Embora tenha-se mostrado superior aos humanos em jogos como xadrez e Go, a inteligência artificial não conseguiu superar a estratégia de armazenamento de memórias do cérebro, que guarda mais dados e de maneira mais simples.
Esta foi a conclusão de Francesca Schönsberg e colegas da Escola Internacional de Estudos Avançados (SISSA), na Itália.
Francesca descobriu que o que parece ser a grande deficiência da memória do cérebro, em comparação com a inteligência artificial, é na verdade seu maior trunfo: o esquecimento entra como um elemento que torna todo o processo mais eficiente.
Memória em redes neurais
As redes neurais, reais ou artificiais, aprendem ajustando conexões entre os neurônios. Tornando essas sinapses mais fortes ou mais fracas, alguns neurônios tornam-se mais ativos, outros menos, até que surja um padrão de atividade. É esse padrão que chamamos de "uma memória".
A estratégia da inteligência artificial é usar algoritmos complexos e longos, que ajustam e otimizam iterativamente as sinapses. Já o cérebro faz isso de maneira muito mais simples: Cada conexão entre os neurônios muda apenas com base em quão ativos os dois neurônios estão ao mesmo tempo.
Os cientistas da computação, contudo, sempre pensaram que a inteligência artificial permitiria armazenar muito mais memórias. Mas, segundo a equipe, em termos de capacidade de memória e sua recuperação, esse saber é amplamente baseado na análise de redes, e assume uma simplificação fundamental: Que os neurônios podem ser considerados unidades binárias.
A nova pesquisa, no entanto, mostrou o contrário: O menor número de memórias armazenadas usando a estratégia do cérebro depende dessa suposição irreal. Quando a estratégia simples usada pelo cérebro para alterar as conexões é combinada com modelos biologicamente plausíveis para a resposta de um único neurônio, essa estratégia funciona tão bem, ou até melhor, do que os algoritmos da inteligência artificial.
O papel do esquecimento
Parece difícil de aceitar a conclusão de que o cérebro é mais eficiente para armazenar memórias do que um algoritmo de computador, mas a equipe afirma que, paradoxalmente, a maior eficiência do cérebro é obtida quando se leva em conta justamente sua maior fraqueza: Os erros - em outra palavra, o esquecimento.
Quando uma memória é efetivamente recuperada, ela pode ser idêntica à entrada original a ser memorizada ou correlacionada a ela. A estratégia do cérebro leva à recuperação de memórias que não são idênticas à entrada original, silenciando a atividade dos neurônios que estão apenas um pouco ativos em cada padrão.
Esses neurônios silenciados, de fato, não desempenham um papel crucial na distinção entre as diferentes memórias armazenadas em uma mesma rede. Ao ignorá-los, os recursos neurais podem ser focados nos neurônios que importam em uma entrada a ser memorizada, permitindo uma capacidade maior.
No geral, diz a equipe, sua pesquisa destaca como procedimentos de aprendizagem auto-organizados e biologicamente plausíveis podem ser tão eficientes quanto algoritmos de treinamento lentos e neuralmente implausíveis.
A questão que se agora se coloca é se esse conhecimento poderá ser usado para melhorar os algoritmos de inteligência artificial para que eles ganhem em eficiência.
Bibliografia:
Artigo: Efficiency of Local Learning Rules in Threshold-Linear Associative Networks
Autores: Francesca Schönsberg, Yasser Roudi, Alessandro Treves
Revista: Physical Review Letters
Vol.: 126, 018301
DOI: 10.1103/PhysRevLett.126.018301