Logotipo Engenharia Compartilhada
Home Notícias Marco das Ferrovias abre espaço para inovação em outros setores
ECONOMIA

Marco das Ferrovias abre espaço para inovação em outros setores

Publicado originalmente no portal Jota - 11 de abril de 2022 495 Visualizações
Marco das Ferrovias abre espaço para inovação em outros setores

O novo Marco Legal do Transporte Ferroviário foi sancionado no fim do ano passado e promete movimentar o setor no país. A Lei 14.273/21 busca facilitar investimentos privados na construção de ferrovias, no aproveitamento de trechos ociosos e na prestação do serviço de transporte ferroviário. O texto permitirá a construção de ferrovias por autorização, como ocorre na exploração de infraestrutura em setores como telecomunicações, energia elétrica e portuário. Também poderá ser autorizada a exploração de trechos não implantados, ociosos ou em processo de devolução ou desativação. E, além disso, poderá inspirar outros setores, como o rodoviário.

A diferença de tratamento é flagrante. Enquanto o transporte ferroviário recebe estímulo e conta agora com um marco regulatório que abre o mercado para novos operadores, o transporte rodoviário sofre com leis que inibem, quando não simplesmente inviabilizam, a entrada de novos investimentos.

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate, a expectativa para o futuro é a melhor possível. Do outro lado, a Associação Brasileira dos Fretadores Colaborativos (Abrafrec) aponta que a inovação e a abertura de mercado são alvos constantes das empresas que dominam o setor há décadas, e a regulação não acompanhou a inovação trazida pela tecnologia.

Incentivos às ferrovias

“Estávamos precisando de incentivos para que pudéssemos crescer de forma geral. O marco das ferrovias pode nos levar a um novo patamar”, diz Vicente Abate, da Abifer.

“Há muitas oportunidades de investimento no Brasil nos modais de transporte público, mas, para tanto, é fundamental que haja a implementação de mecanismos legais e operacionais, que demonstrem a atratividade desses ativos aos investidores”, avalia Alberto Sogayar, sócio da MAMG Advogados, que atua em projetos envolvendo engenharia e construção.

Uma concepção errada que se tem é que há no Brasil muitas rodovias e em bom estado de conservação. Não é o caso.

Para se ter ideia do potencial rodoviário, um levantamento da Confederação Nacional do Transporte (CNT) avaliou 109.103 quilômetros de estradas pavimentadas federais e estaduais e constatou que o estado geral de 61,8% da malha rodoviária brasileira é classificado como regular, ruim ou péssimo.

“Se tem a falsa ideia de que o Brasil tem muitas rodovias. O que de fato houve é um desinteresse histórico de investimento nos setores ferroviário e aquaviário, mas isso não quer dizer que haja muitas rodovias no Brasil”, diz Sogayar.

Segundo o estudo da CNT, os pavimentos deficientes implicam mais gastos com despesas de manutenção do veículo. Sete em cada dez das rodovias sob administração pública mostraram irregularidades, o que acarreta um acréscimo estimado de 35,2% nos custos operacionais.

A CNT mapeou também o volume de investimentos no setor. Em 2016, foram investidos R$ 10,8 bilhões na infraestrutura das rodovias públicas federais. Em 2019 esse montante caiu para R$ 7,56 bilhões e, em 2021, para R$ 5,8 bilhões.

Mas Sogayar lembra que mudar essa realidade por meio de investimento privado exige segurança jurídica e Judiciário eficiente e célere que garantam a participação desses novos atores no mercado brasileiro.

O advogado não tem dúvida de que ainda há espaço para a implantação de inúmeras melhorias no setor rodoviário, mas lembra que é fundamental que haja políticas públicas que fomentem linhas de crédito que sejam atrativas e que se encaixem nos estudos de viabilidade daquele negócio.

O que mudou com a aprovação do Marco das Ferrovias

Desde a aprovação da matéria, seis grupos empresariais já receberam autorização do governo federal para tirar do papel projetos de construção e operação de nove ferrovias no país. Juntas, as estradas de ferro autorizadas têm potencial de agregar mais de 3,5 mil quilômetros de novos trilhos à rede ferroviária existente no país e mobilizar R$ 50,36 bilhões em investimentos no modal. Para se ter uma ideia do impacto, o orçamento público do Ministério da Infraestrutura no ano passado foi de apenas R$ 7 bilhões.

Ao se responsabilizar pela construção e operação de uma ferrovia, o investidor privado também assume altos riscos. Abate lembra alguns deles: “Temos a questão do licenciamento ambiental, engenharia…”, diz. É o preço do avanço. “Mas o Ministério da Infraestrutura já se colocou à disposição para dar todo o suporte técnico”, completa.

Hoje, 20% do transporte de carga no país é feito pela matriz ferroviária; até 2035, a expectativa é que esse valor corresponda a 40%. Quanto aos postos de trabalho, o setor prevê um salto para 225 mil empregados até 2035. Hoje são 16 mil trabalhadores no setor ferroviário. Há três anos, esse número era um pouco mais expressivo: 20 mil. Confirmada a expectativa de contratação, seria um incremento para lá de expressivo.

Em termos de transporte de passageiros, a participação é limitada e não necessariamente contemplada pelo marco das ferrovias. Há, entretanto, um documento em elaboração no Ministério da Infraestrutura para ampliar o uso dos trilhos neste sentido. A pasta está recebendo contribuições para só então apresentar relatório sobre o tema.

Em nota, a Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos) informou que apoia o Governo Federal na elaboração do documento.

“A Política Nacional tem o objetivo de desenvolver o sistema ferroviário de passageiros, proporcionando uma alternativa de transporte à população brasileira e propondo diretrizes para formulação de um modelo de negócio atrativo ao mercado, que potencialize os benefícios sociais e ambientais característicos do modo ferroviário, incentivando uma melhor utilização da malha ferroviária federal existente para o transporte ferroviário de passageiros”.

Regulação estatal x velocidade das inovações

Em 2017, surgiu no Brasil a promessa de oferecer viagens de ônibus de forma mais rápida e barata, em comparação ao valor cobrado pelas empresas de viação tradicionais.

Segundo a Associação Brasileira dos Fretadores Colaborativos, o modelo de fretamento, quando começou, se baseava no chamado “circuito fechado”: um grupo de pessoas contratava um ônibus para levá-las a determinado destino e trazê-las de volta para a cidade de origem.

Acontece que, com a evolução da tecnologia, surgiu o conceito de fretamento colaborativo. Por esse modelo, pessoas que não se conhecem podem “contratar” coletivamente um ônibus, com algumas diferenças em relação ao modelo antigo: a volta não precisa ser com as mesmas pessoas, o ônibus não tem de ser o mesmo e a reserva permite ao passageiro ser parte do grupo de viagem (não há assentos reservado para ele).

Porém, esse modelo de transporte passou a ser amplamente contestado por outras empresas do setor, o que levou a diversas disputas judiciais nos últimos anos. É o preço de desbravar um mercado novo.

Para Sogayar, é “extremamente interessante” haver regulamentação na utilização dessa modalidade de transporte, sempre no intuito de bem proteger todos os seus usuários.