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MEIO AMBIENTE

A Química moderna só gera lixo?

por Redação do Site Inovação Tecnológica - 31 de agosto de 2023 3321 Visualizações
A Química moderna só gera lixo?

O futuro da química em poucas palavras: Um foco triplo de eficiência, segurança e circularidade é necessário para conduzir a Química rumo à sustentabilidade.
[Imagem: HIMS]


Precisamos de uma nova Química

Há algum tempo tem pairado uma autocrítica ainda velada no mundo acadêmico, com os químicos afirmando que sua disciplina tem-se comportado muito diferente da Física, que seria muito mais "corajosa" no abraçar de novas ideias e novas técnicas.

Agora, Hannah Flerlage e Chris Slootweg, da Universidade de Amsterdã, nos Países Baixos, resolveram deixar as meias-palavras de lado e trouxeram a discussão a público em um artigo publicado pela renomada revista Nature.

E a crítica agora vai além dos métodos da Química, abordando os próprios objetivos a que a disciplina tem-se proposto: "A Química moderna é literalmente lixo porque facilita o caminho da matéria desde a extração até a poluição," escrevem Flerlage e Slootweg.

Os dois argumentam que os químicos modernos precisam ampliar seus horizontes e considerar os efeitos da Química "além do vaso de reação e da capela". A fim de combater as crises ambientais cada vez maiores e alcançar a sustentabilidade real, a Química precisa desenvolver um foco combinado em eficiência, segurança e circularidade.

Todos os tipos de resíduos, tanto provenientes de processos de fabricação de produtos químicos quanto dos seus produtos finais, muitas vezes de curta duração, resultaram em problemas de saúde humana e desastres ambientais em escalas variadas. Reconhecidamente, nas últimas décadas, métodos sintéticos cada vez mais sustentáveis se tornaram disponíveis, minimizando ou mesmo eliminando o uso de substâncias e resíduos perigosos.

Mas, Flerlage e Slootweg perguntam retoricamente, "A Química já chegou lá?" A resposta deles: "De jeito nenhum!".

Além das moléculas legais

O artigo defende que os químicos precisam começar a olhar além das "moléculas legais" e da "química incrível". Claro, pode ser divertido e recompensador criar moléculas esteticamente agradáveis, mas isso ignora o papel da Química no mundo moderno.

A título de exemplo, os dois especialistas citam o perfluorocubano, uma molécula que em 2022 foi designada "Molécula do Ano". Sua síntese pode ser umaconquista astronômica e provavelmente haverá aplicações futuras em potencial, mas sua estrutura, contendo múltiplas ligações carbono-flúor, sugere que o perfluorocubano persistirá no ambiente e se bioacumulará.

A síntese do perfluorocarbono mostra o "roteiro de sucesso" da Química moderna: Legal, mas sem qualquer conexão com as necessidades do mundo real.
[Imagem: Masafumi Sugiyama et al. - 10.1126/science.abq0516]

Flerlage e Slootweg argumentam que a Química moderna precisa levar essas preocupações ambientais a sério e desde o início. Eles consideraram ser antiético desenvolver uma química que leve à poluição química. Eles pedem o fim de compostos mal projetados, em particular os chamados "produtos químicos eternos", como substâncias alquil per e poli-fluoradas e os retardadores de chama bromados.

Os dois especialistas tiraram o véu da autocrítica da Química, que vem sendo feita há anos no mundo acadêmico.
[Imagem: Yvonne Compier/HIMS]

Pensamento sistêmico

Como a Química é a ciência da transformação da matéria, e não apenas da criação de novas moléculas, Flerlage e Slootweg apontam a responsabilidade de desenvolver uma química e produtos químicos seguros, que usem os recursos mundiais de forma mais eficaz e melhorem a sustentabilidade.

Isso requer uma abordagem de pensamento sistêmico fundamentada no reconhecimento da sustentabilidade como uma propriedade emergente, e guiada por uma compreensão da base molecular da sustentabilidade. Isto significa que a Química não deve se concentrar apenas no uso de recursos renováveis e na redução dos resíduos da produção; ela também deve considerar as pegadas ambientais do ciclo de vida e as implicações ambientais gerais dos (novos) produtos químicos.

Como exemplo dos caminhos aparentemente fáceis, mas enganosos, Flerlage e Slootweg mencionam polímeros de base biológica, como o bioPE, que é feito de bioetanol. Esses polímeros reduzem o uso de recursos fósseis, mas não melhoram a reciclabilidade ou a biodegradabilidade, e assim continuam a contribuir para a poluição plástica.

A estratégia da química verde é substituir substâncias perigosas usadas nos processos industriais por compostos benignos e recicláveis.
[Imagem: Michael J. Krause/Western University]

Valores centrais da Química

Em seu artigo, Flerlage e Slootweg defendem um foco triplo: Eficiência, segurança e circularidade, tanto em relação aos processos químicos (síntese) quanto aos produtos (estrutura química).

Esses três valores centrais da Química moderna são descritos pelos paradigmas da química verde, segura e sustentável por design, e pela química circular. Tudo isso deve ser cumprido simultaneamente para que a Química dê uma contribuição real para a sustentabilidade.

Tudo isso tornará a Química mais desafiadora, mas também mais recompensadora, escrevem Flerlage e Slootweg: "Nós precisamos ampliar nossos horizontes e considerar nossa Química além do vaso de reação e da capela: Como as moléculas e os materiais que produzimos interagem com a tecnosfera (sistemas industriais e sociedade) e a biosfera (natureza)?"

Para eles, a Química só terá um impacto real e positivo na sustentabilidade quando abraçar totalmente o design circular, o pensamento do ciclo de vida, a toxicologia humana e ambiental e a avaliação do impacto ambiental e social.