O caminho correto da gestão privada na infraestrutura
A baixa qualidade dos serviços logísticos no Brasil repercute diretamente na competitividade do produto nacional e na atração de novos investimentos produtivos no país. Estradas de má qualidade, portos ineficientes, cabotagem pequena, e falta de ferrovias e de áreas de armazenagem, entre outros fatores, afetam a indústria e a sua capacidade de se integrar às cadeias globais de produção.
O estudo Competitividade Brasil 2014, da Confederação Nacional da Indústria (CNI), mostra que os vários problemas da infraestrutura de transportes colocam o país em último lugar em um ranking que o compara com 14 outras nações que disputam espaço no mercado mundial, como Austrália, México, Espanha, Índia e Rússia. Quando se analisa por modais, também ficamos em último em portos e aeroportos, e em 13º nos quesitos ferrovias e rodovias. Na prática, a falta de qualidade na malha de transportes se traduz em frete mais caro e maior tempo gasto no deslocamento de mercadorias.
O novo programa de concessões do governo federal veio para reduzir esse problema. A ampliação da gestão privada em vários setores da infraestrutura representa um importante passo no caminho para a recuperação da competitividade. É claro que os diversos projetos lançados serão objeto de análise pelo setor privado. Existem muitos detalhes que ainda serão divulgados e precisam da acurada avaliação dos investidores. Mas, em linhas gerais, o caminho está correto.
Na primeira etapa do Programa de Investimentos em Logística (PIL), lançada em 2012, houve importantes avanços com a privatização de cinco grandes aeroportos e de trechos rodoviários, além da autorização para a construção de 34 terminais privativos, que foram possíveis após a aprovação da nova Lei dos Portos, de junho de 2013.
No setor ferroviário, o programa não avançou porque o mercado rejeitou o modelo de exploração proposto e porque os projetos e estudos técnicos dos trechos ferroviários não estavam completos. Quanto às licitações de áreas portuárias públicas, dentro dos portos organizados, o PIL de 2012 também marcou passo. Os editais ficaram sob avaliação dos órgãos de controle por mais de um ano, sendo liberados apenas no mês passado.
O novo PIL trouxe vários avanços, como a continuidade do programa de aeroportos e rodovias. O modelo de outorga rodoviária é conhecido e aceito pelo setor privado, como comprova o sucesso das últimas rodadas de estradas federais. A concessão de aeroportos é outra experiência de êxito, que deve continuar com a decisão de reduzir a participação da Infraero de 49% para 15% no consórcio vencedor. Isso atende uma das propostas apresentadas pela indústria.
Outro ponto positivo foi o novo modelo ferroviário, com direito de passagem, que prevê competição. Houve aperfeiçoamentos em relação ao programa de 2012, o que deve refletir no aumento da capacidade do sistema e tornar mais atrativo o investimento privado. Mesmo assim, é preciso que o direito de passagem seja estendido a toda rede ferroviária, o que só será possível por meio de uma ampla negociação do governo com os atuais concessionários.
Também merecem destaque o novo decreto sobre portos, que simplifica as licitações de áreas públicas, e as outorgas de autorização para terminais privados. O Brasil já possui cerca de 130 terminais desse tipo em operação. Com os 36 recentemente autorizados e com pelo menos parte dos 63 que estão em análise no novo programa, poderemos aumentar a competição no sistema portuário.
A experiência tem demonstrado que as reduções de custo e a elevação da qualidade dos serviços de transporte são alcançadas quando há um ambiente de maior concorrência, o que deve ser proporcionado pelo novo modelo. A alta produtividade dos terminais de contêineres do Porto de Santos e do Estado de Santa Catarina, por exemplo, é uma prova de que a competição funciona nos portos e no transporte marítimo.
Onde ainda podemos avançar? Existem importantes problemas do sistema logístico nacional que não foram abordados de forma consistente. São eles: a baixa eficiência das administrações portuárias públicas, o excesso de burocracia dos órgãos de governo nos portos e a demora no licenciamento ambiental.
Apesar dos avanços obtidos no setor portuário, os grandes portos do país apresentam um baixo nível de eficiência em suas administrações públicas (Cias. Docas e concessionárias estaduais). Elas têm pouca capacidade gerencial e elevados passivos trabalhistas, e estão incapacitadas para promover as transformações necessárias à elevação da eficiência aos padrões internacionais. Tanto a antiga Lei dos Portos (Lei 8.630/93) quanto a nova (Lei 12.815/13) permitem a transferência das administrações.
O excesso de burocracia nos portos brasileiros é resultante de uma série de fatores; entre eles, a falta de articulação e a sobreposição de funções dos diferentes órgãos de governo intervenientes nos portos.
Em 2012, foi editado o Decreto 7.861/12, que prevê a constituição de comissões locais nos portos, compostas de representantes das agências governamentais intervenientes. Essas unidades se articulam em uma Comissão Nacional das Autoridades nos Portos (Conaportos), sob a coordenação da Secretaria Especial de Portos, com a finalidade de integrar as atividades desempenhadas pelas entidades públicas nas instalações portuárias.
Apesar de mais de dois anos desde sua criação, pouca coisa mudou em relação à atuação dos agentes estatais nesse segmento. É fundamental que a Conaportos produza resultados práticos e exerça o seu papel no sentido de fomentar a articulação desses órgãos e reduzir a burocracia.
A demora nos processos de licenciamento ambiental também precisa ser atacada. São numerosos os exemplos do longo período para a obtenção da licença para obras em todos os setores da infraestrutura. Os procedimentos precisam ser aperfeiçoados e tornados mais transparentes.
Por fim, a ampliação do programa anunciada pelo governo aponta na direção correta para destravar investimentos estratégicos com modelos que sinalizam maior segurança e atratividade para o investidor privado. É preciso, contudo, assegurar as condições para que a implantação dos projetos de concessão se confirmem no prazo estabelecido.
A despeito do sensível progresso em alguns modais, a indústria brasileira ainda se ressente do deficit histórico na infraestrutura, que permanece um inconveniente entrave à competitividade da economia nacional. Nesse sentido, boa governança e gestão eficaz serão essenciais para evitar atrasos e a quebra do ritmo dos investimentos. Somente com uma moderna integração logística, o país conseguirá transportar seus produtos de maneira eficiente e concorrer em igualdade de condições no mercado global.
Robson Braga de Andrade é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).