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MECÂNICA

Enigma do atrito: Fricção mais rápida causa desgaste menor

Redação do Site Inovação Tecnológica - 18 de setembro de 2022 445 Visualizações
Enigma do atrito: Fricção mais rápida causa desgaste menor

Um deslizamento lento (esquerda) deixa a estrutura do metal quase intacta. Um deslizamento mais rápido (no meio) a destrói completamente. Mas deslizamentos extremamente rápidos (à direita) derretem apenas a camada superior.
[Imagem: TU Wien]

Entendendo o atrito

Quando duas superfícies metálicas deslizam uma contra a outra, ocorre uma variedade de fenômenos complicados que levam ao atrito e ao desgaste: Pequenas regiões cristalinas, das quais os metais são tipicamente compostos, podem ser deformadas, torcidas ou quebradas, ou mesmo fundidas.

É muito importante que a indústria compreenda esses efeitos, seja para se livrar deles, seja para reforçá-los - o atrito pode ser o vilão para um fabricante de motores, mas pode ser o mocinho para um fabricante de lixas e abrasivos.

A intuição nos diz que, quanto mais rápido as duas superfícies deslizarem uma pela outra, maior será o desgaste.

Mas Stefan Eder, da Universidade Tecnológica de Viena, na Áustria, não se contentou com a intuição, e então se preparou para testar esse fenômeno em velocidades muito difíceis de monitorar com precisão em laboratório.

"No passado, o atrito e o desgaste só podiam ser estudados em experimentos," justificou ele. "Somente nos últimos anos os supercomputadores se tornaram poderosos o suficiente para podermos modelar os processos altamente complexos na superfície do material em escala atômica."

E a surpresa não se fez esperar.

Embora inicialmente o desgaste aumentasse com o aumento da velocidade da fricção entre os dois metais, em velocidades muito altas, comparáveis à velocidade de um avião de passageiros, o comportamento se reverte, com o desgaste diminuindo novamente.


A equipe simulou pela primeira vez ligas metálicas em condições realísticas - mas não esperava por essa estranha curva nos resultados.
[Imagem: S.J. Eder et al. - 10.1016/j.apmt.2022.101588]

Simulando situações reais

Para reforçar os efeitos práticos da pesquisa, Eder não simulou cristais perfeitos de cada metal como normalmente se faz, com um arranjo de átomos estritamente regular e livre de defeitos, mas sim várias ligas metálicas, o que fica muito mais próximo da realidade - uma liga é um arranjo geometricamente muito mais complicado de cristais, que podem ser deslocados uns dos outros ou torcidos em direções diferentes, formando o que as simulações convencionais consideram ser "defeitos".

"Isso é importante porque todos esses defeitos têm uma influência decisiva no atrito e no desgaste. Se simulássemos um metal perfeito no computador, o resultado teria pouco a ver com a realidade," reforçou Eder.

Os resultados mostraram que, em baixas velocidades, da ordem de 10 a 20 metros por segundo (m/s) o desgaste é baixo. O desgaste aumenta conforme a velocidade entra na faixa de 80 a 100 m/s, o que era de se esperar, já que mais energia é transferida para o metal por unidade de tempo.

A surpresa veio quando a velocidade superou os 300 m/s - pouco mais de 1.000 km/h. Em vez de continuar aumentando linearmente, o desgaste voltou a cair. A microestrutura do metal logo abaixo da superfície, que ficava completamente destruída nas velocidades médias, voltou a ficar praticamente intacta, um resultado surpreendente e aparentemente contraditório.

"Isso foi incrível para nós e para a comunidade de tribologia," disse Eder, citando o ramo da ciência que estuda o contato entre materiais - tribos em grego significa atrito.


A compreensão do fenômeno tem impacto em várias indústrias e aplicações técnicas.
[Imagem: S.J. Eder et al. - 10.1016/j.apmt.2022.101588]

Explicação do paradoxo do atrito

A equipe varreu a literatura científica e constatou que outros pesquisadores já haviam documentado essa inversão de comportamento. "Esse efeito foi observado por outros cientistas em experimentos - ele não é muito conhecido porque velocidades tão altas raramente ocorrem. No entanto, a origem deste efeito ainda não havia sido esclarecida," disse o pesquisador.

As simulações mostraram que, em altas velocidades, o atrito gera muito calor - mas de forma muito irregular. Apenas regiões isoladas nas superfícies dos dois metais que deslizam um contra o outro ficam em contato, e essas pequenas áreas podem atingir milhares de graus Celsius. No meio, contudo, o que representa a maior área dos dois materiais, a temperatura é muito mais baixa.

Como resultado, pequenas partes da superfície podem derreter e recristalizar uma fração de segundo depois. A camada mais externa do metal é assim drasticamente alterada, mas é precisamente isso que protege as regiões mais profundas do material: Apenas as camadas mais externas sentem o desgaste, com as estruturas cristalinas por baixo sofrendo poucas alterações.

"Onde quer que ocorra atrito em velocidades altas a extremamente altas, será essencial levar isso em consideração daqui por diante," disse Eder, citando rolamentos e transmissões em veículos elétricos e máquinas que retificam superfícies, como tornos e fresadoras, além do fato de que o efeito desempenha um papel na estabilidade dos metais em um acidente automobilístico ou no impacto de pequenas partículas em aeronaves de alta velocidade.