A celulose biodegradável substitui os produtos atuais à base de plásticos.
[Imagem: Débora França et al. - 10.1016/j.carbpol.2022.119934]
Celulose em vez de plástico
Os fertilizantes são essenciais para a agricultura, mas eles não vêm sem algumas deficiências, entre as quais se destacam a poluição do solo por aplicação excessiva e dos mananciais por lixiviação, e a solubilização rápida demais, agravando aqueles dois problemas e impedindo uma absorção adequada pelas plantas ao longo de toda a duração da cultura.
Para evitar isso, foram desenvolvidos produtos com a função de desacelerar a liberação dos nutrientes, mas são sobretudo revestimentos compostos por polímeros sintéticos, não biodegradáveis, que acabam poluindo o solo na forma dos chamados "microplásticos".
"O grão do fertilizante é do tamanho de uma pedrinha de sal grosso. Para que os nutrientes sejam liberados mais lentamente, ele é recoberto por camadas de polímeros. Uma camada, dependendo do tipo de material, dura mais ou menos dois meses. Então, recobre-se com duas, três ou quatro camadas, conforme o tempo em que se quer liberar o nutriente," explica a professora Roselena Faez, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).
Para superar dessa deficiência, a equipe da professora Roselena se voltou para um componente totalmente biodegradável e que já faz parte da própria cultura: A celulose, um dos principais componentes da estrutura das plantas.
A pesquisadora Débora França, membro da equipe, usou nanocelulose modificada para recobrir as partículas de fertilizantes e desacelerar a liberação dos nutrientes no solo, diminuindo a solubilidade e a mobilidade dos sais que contêm os principais macronutrientes (nitrogênio, fósforo e potássio).
A mistura de nanocelulose e fertilizante passa por um processo de secagem por aspersão, por meio da qual a nanocelulose encapsula os nutrientes. O pó obtido é então submetido a um processamento térmico e prensado em um molde, gerando o produto na forma de tabletes.
Diferente dos produtos comerciais à base de plásticos, o produto desenvolvido pela equipe opera com base na interação química entre a nanocelulose, produzida a partir de resíduos da indústria de papel, e os sais contidos nos fertilizantes, para mantê-los no solo. "Neste trabalho, focamos nos problemas piores: O nitrato e o potássio. E desenvolvemos um material totalmente biodegradável com uma taxa de liberação desses nutrientes muito próxima dos materiais sintéticos disponíveis," disse a professora Roselena.
A celulose da cana-de-açúcar foi usada para fazer papel e vasos autofertilizantes.
[Imagem: Luiz Messa et al. - 10.1016/j.indcrop.2022.115350]
Papel com fertilizante
Já o pesquisador Lucas Messa trabalhou com a celulose do bagaço da cana-de-açúcar, modificando-a com uma carga negativa na superfície por meio da incorporação de porções de fósforo (fosforilação), o que permite a entrega controlada da nutrição vegetal.
Assim, as cargas positivas dos macro e micro-nutrientes se ligam às cargas negativas de fósforo na superfície celulósica, retardando o processo de liberação dos nutrientes.
Lucas preparou três tipos de estruturas com a celulose fosforilada: Filmes semelhantes a um papel; um pó, com o uso da mesma técnica de secagem por aspersão; e uma estrutura muito leve, parecida com isopor, por meio de secagem por congelamento.
"Tecnologicamente, a estrutura semelhante a um papel foi o melhor material que produzimos para entregar nutrientes de maneira controlada. Com esse papel pode-se criar vários produtos," contou Roselena.
Para demonstrar um desses produtos, a equipe criou pequenos vasos, conhecidos como potes de propagação, para o cultivo de mudas. Quando se degrada, o "papel fertilizante" já libera o fósforo que está em sua composição. E o processo de fabricação é muito barato: "São mais ou menos R$ 0,27 por grama de papel produzido. O vasinho deve ter mais ou menos 1 grama. Sai, portanto, cerca de R$ 0,30 a unidade, pensando no preço de laboratório," detalhou a pesquisadora.
Já existem potes de propagação biodegradáveis no mercado, mas o produto criado pela equipe brasileira já tem o fertilizante no próprio material, o que é um grande diferencial. Tanto que a inovação já atraiu a atenção de produtores de plantas ornamentais, que vão começar a testar o produto, que fornece uma espécie de "autofertilização" para as plantas.