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Inteligências artificiais estão criando uma massa de ‘desempregados digitais’, diz professor

Annie Castro - Sul21 - 17 de maio de 2019 1085 Visualizações
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Wilson Engelmann acredita que revolução tecnológica poderá gerar desempregados digitais em massa. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Annie Castro

Uma nova revolução industrial, baseada na tecnologia e que vem afetando diretamente o mercado de trabalho. Este foi o tema da fala do professor de Direito Wilson Engelmann no simpósio ‘Futuro do Trabalho’, promovido pela Escola Superior do Ministério Público da União, que  aconteceu na Procuradoria Regional da República da 4ª Região, em Porto Alegre, na última quinta-feira (9). Autor do livro ‘Direitos da Nanotecnologias e o meio ambiente de trabalho’, Engelmann abordou os impactos dessas transformações no crescimento do desemprego e sugeriu possibilidades, baseadas na qualificação dos trabalhadores, para frear esse impacto.

Desde 2008, Engelmann pesquisa as nanotecnologias e seus impactos sociais, ambientais e jurídicos, tendo como foco principal a regulamentação e a relação entre o direito e as áreas tecnológicas. Engelmann citou um dos fundadores do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, para falar da quarta revolução industrial que o mundo estaria vivendo. “Todas essas tecnologias, como a inteligência artificial, as impressões 3D, os novos materiais inteligentes, têm na base a nanotecnologia. Isso significa que se tratam de sistemas que são desenvolvidos a partir da nanoescala”, explica.

Todas mudanças tecnológicas que acontecem hoje ocorrem por meio da nanotecnologia, salientou. “Temos coisas cada vez menores, invisíveis ao olho nu, mas cada vez com mais capacidade de armazenamento, com mais flexibilidade, mais resistência e mais capacidade de condução elétrica”, afirma. Essas inteligências artificiais estão afetando fortemente o mercado de trabalho, causando uma massa de “desempregados digitais”, ou seja, pessoas que perderam seu emprego para um sistema de computador ou uma máquina.

Engelmann explica que é possível observar esse fenômeno especialmente em atividades repetitivas ou braçais. “A autonomação está atingindo a mão de obra. Hoje, ao invés de você ter grandes linhas de produção, com centenas de pessoas trabalhando, você tem robôs, braços mecânicos, tem toda uma inteligência artificial que comanda a produção”. Um dos exemplos citados pelo pesquisador é o setor automobilístico, onde robôs já estão substituindo o trabalho humano na montagem de carros. Segundo ele, esse seria o “lado perverso” da revolução industrial que acontece atualmente.

Engelmann observa esses mesmos efeitos dentro do ambiente jurídico e nos profissionais do Direito. Atualmente existem sistemas tecnológicos que realizam a tarefa de buscar artigos e pesquisar sobre jurisprudência e legislação, além de recolher fontes que serão utilizadas em processos e casos. De acordo com Engelmann, até então, nos grandes escritórios e nos tribunais esse trabalho era realizado por estagiários e por advogados recém aprovados na prova da Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

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Governos deveriam lançar políticas públicas de capacitação. Foto: Guilherme Santos/Sul21
 
Uma vez que a robotização da mão de obra já está acontecendo na sociedade, é possível que entre os desempregados no Brasil hoje já existam vítimas dessa revolução industrial, conforme afirma Engelmann. “Temos milhões de desempregados, mas qual é a qualidade deles? São pessoas que foram demitidas porque a empresa fechou, que é uma situação, ou são pessoas que foram demitidas porque houve automatização daquilo que elas faziam?”, questiona o professor.

Apesar da geração de desemprego em massa, Engelmann acredita que também ocorrerá o surgimento de novos empregos. Porém, o pesquisador aponta que, principalmente no Brasil, os governos e os empresários não estão focados em capacitar os trabalhadores que perderão seus empregos devido à robotização da mão de obra. “O momento seria de dar uma qualificação para essas pessoas, mas isso não acontece”, afirma.

De acordo com ele, essa seria uma tarefa que deveria ser encarada como uma política pública por parte do governo, seja ele federal, estadual ou municipal. “O governo deveria se preocupar com isso, lançar políticas públicas, lançar cursos de capacitação e botar esses trabalhadores para aprenderem uma nova coisa, um novo ofício”, afirma. Porém, de acordo com Engelmann, o poder público não enxerga isso como uma prioridade no momento.

Havendo a ausência de políticas públicas desenvolvidas por governantes, seria função das empresas produzirem a capacitação e a assistência aos trabalhadores. “Se ela sabe que vai ter uma linha de produção automatizada, ela deveria capacitar os funcionários e aí ter um benefício, como um subsídio de tributo. Aí a empresa vai capacitar os funcionários e mesmo que ela não os reaproveite, eles serão demitidos, mas eles vão poder se recolocar no mercado de trabalho”, pontua.

Para ele, a solução deveria vir de uma parceria público-privada, uma vez que essa iniciativa não irá surgir somente por iniciativa das empresas ou dos governos. “Elas não vão enxergar um lucro imediato nisso, e o poder público não tem condições. E se nenhum ceder, eu não tenho nenhuma bola de cristal, mas a gente vai ter problemas sérios daqui pra frente, de muito desemprego”.

Hermenêutica de prevenção
A interpretação das leis que existem hoje no Direito seria a outra alternativa para proteger os trabalhadores vítimas da revolução industrial, de acordo com Engelmann. “A hermenêutica de prevenção aparece nesse sentido de você interpretar o direito que a gente tem”, explica ele. O professor pontua que no Artigo 7º da Constituição de 1988 é mencionada como um dos direitos dos trabalhadores a proteção contra a automação industrial, mas que o artigo nunca foi regulamentado. “Esse direito fundamental que o trabalhador tem de ser protegido de alguma maneira não está regulamentado. Então como que a gente faz? Na Constituição e na legislação trabalhista existem uma série de princípios”, assinala.

Engelmann exemplifica que o princípio da dignidade humana, a função social da empresa e o valor social do trabalho seriam alguns dos princípios existentes na Constituição. “Simplesmente o empresário pode demitir o empregado por que vai ter uma máquina fazendo? Não deveria. Então temos que interpretar esses princípios para tentar buscar soluções, sem esperar pelo Estado”.